Apelação/Remessa Necessária Nº 5117330-26.2021.4.02.5101/RJ
RELATOR: Desembargadora Federal CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)
APELADO: MINERACAO USIMINAS S.A. (IMPETRANTE)
RELATÓRIO
1. Trata-se de Remessa Necessária e Apelação interposta pela União Federal em face da r. sentença proferida pelo Juízo da 32ª Vara Federal do Rio de Janeiro, nos autos do Mandado de Segurança, que concedeu a segurança para declarar o direito da autora de aproveitar os créditos de PIS e COFINS sobre os valores pagos a título de CFEM, garantindo-lhe, ainda, o direito de receber restituição ou realizar a compensação tributária, valendo-se dos montantes indevidamente recolhidos, na forma estabelecida na legislação de regência, após o trânsito em julgado da decisão (art. 170-A do CTN), observado o prazo de cinco anos (art. 168, I, do CTN), ficando a operação sujeita ao regramento da Secretaria da Receita Federal do Brasil.
2. Em suas razões recursais, a União alega que a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) não é um insumo utilizado no processo produtivo do contribuinte, mas mera compensação financeira que a empresa paga pelos danos sociais e ambientais causados pela extração do minério, e que, por isso, é impossível considerar tal receita como custo de produção.
Requer, por fim, o provimento do recurso com a atribuição de efeito suspensivo e, ao final, o provimento deste recurso a fim de que seja reformada a r. sentença. (Evento 30 dos autos originários).
3. Em contrarrazões a impetrante alega que a natureza jurídica da CFEM é contraprestacional, ou seja, é uma receita originária que representa a contrapartida paga pelo minerador em razão da aquisição de bem mineral da União, e não uma compensação por dano ambiental e social, como alega a União Federal. Alega, ainda, que a CFEM se caracteriza como insumo essencial ao seu processo produtivo e que, hipoteticamente, caso seja retirada, pode resultar até mesmo no encerramento definitivo das suas atividades. Nesse sentido, o pagamento da CFEM autoriza o aproveitamento dos créditos das contribuições ao PIS e à COFINS, diante da sua inerente essencialidade e relevância ao processo produtivo. (Evento 37 dos autos originários).
4. O Ministério Público Federal manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso. (Evento 26).
É o relatório. Peço dia para julgamento.
VOTO
1. Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço da Remessa Necessária e da Apelação e nego-lhes provimento.
2. Cuida-se de Remessa Necessária e Apelação interposta pela União Federal em face da r. sentença que concedeu a segurança para declarar o direito da autora de aproveitar os créditos de PIS e COFINS sobre os valores pagos a título de CFEM, garantindo-lhe, ainda, o direito de receber restituição ou realizar a compensação tributária, valendo-se dos montantes indevidamente recolhidos, na forma estabelecida na legislação de regência, após o trânsito em julgado da decisão (art. 170-A do CTN), observado o prazo de cinco anos (art. 168, I, do CTN), ficando a operação sujeita ao regramento da Secretaria da Receita Federal do Brasil.
3. A Constituição da República assegurou, no art. 20, § 1º, à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.
4. A Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) de uma cobrança que tem como fundamento a utilização pelo particular do bem público relacionada à exploração de recurso mineiras.
5. CFEM na base de cálculo do PIS e COFINS
Em sede infraconstitucional, a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais foi instituída por intermédio da Lei 7.990/1989 e regulamentada, quanto aos percentuais da distribuição da compensação financeira, pela Lei nº 8.001/1990, cuja alteração foi promovida pela Lei n° 13.540/2017, fruto da conversão da Medida Provisória nº 789, de 2017. Atualmente a CFEM incide, entre outros, sobre a receita bruta da venda, com uma alíquota limitada a 4% (quatro por cento).
Em contrapartida, segundo a tese da impetrante, haveria tributação somente da receita líquida, em clara oposição à determinação legal. Isso porque, de um modo geral, a Lei n.° 9.718/98 (aplicável às pessoas jurídicas sujeitas à incidência do PIS e COFINS no regime cumulativo) e as as Leis n.°s 10.637/2002 e 10.833/2003 (que instituíram a técnica da não cumulatividade do PIS e da COFINS) elegeram como base de cálculo das contribuições a receita bruta, assim entendida a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica.
Ressalte-se que a CFEM é o preço que a impetrante paga pela extração do minério que pertence à União (royalties), ou seja, encargo suportado pela impetrante em razão da exploração do patrimônio público.
Sendo assim, não tem natureza de tributo, fato que por si só distingue da hipótese decidida pelo STF no Tema 69 ("O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins"), desqualificando a pretensão da impetrante de excluí-la da base de cálculo do PIS e da COFINS.
Por outro lado, a CFEM constitui espécie de receita patrimonial da União como ressarcimento pela exploração mineral, ou seja, receita pública não tributária, conforme decidido pelo E. STF na ADI 48461e constituindo, juntamente com os demais custos necessários ao exercício de sua atividade econômica, parte da sua despesa operacional.
Tratando-se de despesa operacional e não de insumo, merece ser rechaçada a tese do ora apelado, na esteira do entendimento firmado pelo e. STJ, a saber, in verbis:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. NÃO-CUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. CONCEITO DE INSUMOS. AFERIÇÃO DEVE SER FEITA NO CASO CONCRETO. CRITÉRIOS DE ESSENCIALIDADE E RELEVÂNCIA. MATERIAIS ADQUIRIDOS PELO CONTRIBUINTE NÃO FORAM CONSIDERADOS COMO INSUMOS PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. REEXAME DAS PREMISSAS FÁTICAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ.
I -
II - O Superior Tribunal de Justiça fixou, em regime de recursos repetitivos (REsp 1.221.170/PR, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, DJe 24/4/2018), o entendimento segundo o qual, para fins do creditamento relativo à contribuição ao PIS e à COFINS, o conceito de insumo deve ser aferido, no caso concreto, à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de terminado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.
III - No presente caso, o Tribunal de origem afastou o alegado direito líquido e certo ao creditamento a título de contribuição ao PIS e à COFINS incidente sobre os materiais (peças, combustíveis e lubrificantes) utilizados no transporte de produção da recorrente, na apuração da contribuição.
IV - ...
V - ...
VII - Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp n. 1.747.154/SE, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 22/4/2020, DJe de 24/4/2020.)
Ademais, como sua incidência é o posterior à ocorrência do fato gerador da COFINS e da Contribuição para o PIS - venda de bens ou prestação de serviço -, compondo, portanto, a base de cálculo do PIS e da COFINS (faturamento ou receita bruta), a teor dos art. 2º e 3º da Lei n.° 9.718/98 e dos arts. 1° das Leis n. 10.637/2002 e n. 10.833/2003.
Mencione-se, neste sentido, o entendimento esposado pela 3ª Turma este E. Tribunal, em caso semelhante ao presente, no sentido da não aplicação do precedene do STF à hipótese dos autos2, valendo transrever o seguinte trecho, in verbis:
Dito isso, estou convencido de que acolher a tese sufragada pela parte Autora estaríamos a autorizar tributação somente da receita líquida, em clara oposição à determinação legal. Isso porque, de um modo geral, a Lei n.° 9.718/98 (aplicável às pessoas jurídicas sujeitas à incidência do PIS e COFINS no regime cumulativo) e as as Leis n.°s 10.637/2002 e 10.833/2003 (que instituíram a técnica da não cumulatividade do PIS e da COFINS) elegeram como base de cálculo das contribuições a receita bruta, assim entendida a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica.
No mesmo sentido, esta E. 4ª Turma decidiu, in verbis:
TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO DO PIS E DA COFINS DA BASE DE CÁLCULO DA COMPENSAÇÃO FINANCEIRA PARA A EXPLORAÇÃO DOS RECURSOS MINERAIS - CFEM E DAS PRÓPRIAS CONTRIBUIÇÕES. NÃO APLICAÇÃO DO PRECEDENTE DO STF (RE 574.706) À HIPÓTESE DOS AUTOS;
1. A pretensão da parte autora reside no reconhecimento do direito de recolher o PIS e a COFINS, sem a inclusão, em suas bases de cálculo, dos valores correspondentes a CFEM, ao PIS e a COFINS, bem como a compensação dos valores recolhidos indevidamente a esse título, com débitos vencidos ou vincendos relativos a qualquer tributo arrecadado e administrado pela Secretaria da Receita Federal e/ou a restituição de tais valores, tudo devidamente corrigido.
2. O excelso Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que "o ICMS não compõe a base de cálculo para a PIS e da COFINS”, conforme RE nº 574.706.
3. O precedente estabelecido pelo excelso Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 574.706 não pode ser estendido às demais exações incidentes sobre a receita bruta, uma vez que se trata de tributos distintos. Desse modo, embora se trate de precedente de observância obrigatória quanto à matéria nele analisada (restrita ao ICMS), há que se ressaltar que inexiste identidade de situação com a hipótese suscitada nos autos.
4. A inclusão do PIS e da COFINS em suas próprias bases de cálculo está de acordo com o princípio da legalidade tributária insculpido no art. 150, I, da CF. O simples fato de os valores dispendidos com as contribuições não representarem acréscimo patrimonial não é suficientes para excluí-los da base de cálculo do PIS e da COFINS. Isso porque estas não incidem sobre o lucro da empresa, e sim sobre o seu faturamento, conceito que, a priori, deve ser interpretado segundo os parâmetros fixados na legislação tributária, inexistindo, assim, violação ao princípio da capacidade contributiva, referida no art. 145,§ 1º, da CF (TRF4 5011072-48.2018.4.04.7200, PRIMEIRA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 30/01/2019)
5. O Supremo Tribunal Federal já apreciou controvérsia acerca da suposta inviabilidade da incidência tributária mediante o denominado “cálculo por dentro”, ocasião em que firmou entendimento no sentido de que a referida cobrança não ofende qualquer preceito constitucional.
6. Não mais pairam dúvidas acerca da natureza jurídica da Compensação Financeira para a Exploração dos Recursos Minerais, tendo em vista a decisão do STF, ao julgar o RE 228800, em que foi Relator o Ministro Sepúlveda Pertence na qual foi afastada a natureza tributária, reconhecendo-se que a referida compensação se configura como receita patrimonial.
7. A legislação (art. 2º da Lei nº 8.001/90 e o art. 6º da Lei nº 7.990/89) determina a dedução dos tributos referentes ao processo de industrialização (PIS/ PASEP, COFINS e ICMS) na apuração da base de cálculo da CFEM.
8. É cabível a exclusão, tão-somente, de despesas efetivamente realizadas e comprovadas com o pagamento dos tributos. No caso em exame, contudo, a apelada não logrou comprovar as parcelas passíveis de dedução dos valores obtidos com a comercialização do produto mineral.
9. Condenação da parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa, na forma do art. 85, § 3º, I, do CPC.
10. Remessa necessária e apelação providas.
(TRF2- AC N° 5002822-13.2020.4.02.5001, Rel. Desembargador Federal LUIZ ANTONIO SOARES, QUARTA TURMA ESPECIALIZADA, julgado em 26/04/2021)
Quanto mais não fosse, o Poder Judiciário não pode atuar como legislador positivo para estabelecer isenções, reduções de tributos e deduções de despesas da base de cálculo, visto que tais hipóteses são sempre dependentes de lei.
Assim, conclui-se pelo provimento da remessa necessária e a apelação da União Federal/Fazenda Nacional para, reformando a sentença, julgar improcedentes os pedidos e denegar, por conseguinte, a segurança.
Ante o exposto, voto no sentido de DAR PROVIMENTO à Remessa Necessária e à Apelação para denegar a segurança.
Documento eletrônico assinado por CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20001019793v41 e do código CRC 7c07ad88.
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Data e Hora: 8/3/2023, às 12:54:8