Apelação Cível Nº 5000609-97.2021.4.02.5001/ES
RELATOR: Desembargador Federal ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES
APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
APELADO: RAQUEL VELLO CORREA NETTO (AUTOR)
APELADO: FABIO VELLO CORREA (AUTOR)
APELADO: MARTA VELLO CORREA NOGUEIRA (AUTOR)
APELADO: INES VELLO CORREA (AUTOR)
APELADO: JANE MARIA VELLO CORREA DE CASTRO (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto pela UNIÃO contra sentença (evento 49) proferida pelo juízo da 05ª Vara Federal Cível de Vitória/ES, que julgou procedente o pedido autoral de FÁBIO VELLO CORRÊA, INÊS VELLO CORRÊA, JANE MARIA VELLO CORRÊA DE CASTRO, MARTA VELLO CORRÊA NOGUEIRA e RAQUEL VELLO CORRÊA NETTO para “reconhecer a nulidade da multa de transferência oriunda do imóvel inscrito sob o RIP n° 5705.0003290-72, no valor de R$ 36.785,92”.
Como causa de pedir, narraram que herdaram de seu pai José Luiz Cláudio Corrêa a casa situada na Rua Honório Ferreira de Andrade, nº 51, Santa Lúcia, Vitória/ES, a qual constitui imóvel sob regime de ocupação da União, registrada no RIP 5705 0003290-72, e, ao finalizar o inventário no ano de 2017, solicitaram à Secretaria de Patrimônio da União a autorização para transferência não onerosa do imóvel para os seus nomes.
Prosseguiram aduzindo que após a solicitação de autorização de transferência, os requerentes apenas retornaram para averbá-la no ano de 2020, quando foram surpreendidos por uma multa no valor de R$ 36.785,92 (trinta e seis mil setecentos e oitenta e cinco reais e noventa e dois centavos), por supostamente terem incorrido na conduta descrita no § 5º do artigo 3º do Decreto-Lei 2.398/87.
Afirmaram que, conforme determinação legal, somente nos casos em que a transmissão do direito de domínio ou da titularidade do terreno de marinha, pertencente a União, se der de forma onerosa e com o devido pagamento do laudêmio, é possível aplicar a multa prevista no §5º por inobservância do prazo de 60 (sessenta) dias para a transferência da titularidade estipulado pelo § 4º, ambos do artigo 3º do Decreto-Lei 2.398/87.
Asseveraram que o fato do valor da multa ser extraordinariamente superior ao valor que seria pago a título de laudêmio, caso o mesmo fosse devido, demonstra a sua desproporcionalidade e o seu caráter confiscatório, o que é vedado.
Nesse sentido, ajuizaram a demanda em análise pleiteado a anulação da “multa aplicada pela Secretaria de Patrimônio da União, (...), no montante de R$ 36.785,92 (trinta e seis mil setecentos e oitenta e cinco reais e noventa e dois centavos), por suposto atraso na transferência do imóvel registrado no RIP 5705 0003290-72” e, subsidiariamente, a redução do “valor da multa referente à multa por suposto atraso na transferência do imóvel registrado no RIP 5705 0003290-72, para valor inferior ao que teria sido pago caso o laudêmio fosse devido, ou seja, R$ 7.728,14 (sete mil setecentos e vinte e oito reais e quatorze centavos)”.
A magistrada sentenciante, ao acolher o pleito autoral, asseverou que sendo a multa prevista no § 5º do art. 3º, do Decreto-Lei nº 2.398/87, acessória à cobrança de laudêmio disciplinada no respectivo caput para as transmissões onerosas do domínio útil e da inscrição de ocupação de terreno da UNIÃO, incabível seria a sua aplicação à hipótese em apreço (alteração do registro cadastral em razão de herança).
Consignou, ainda, que “não há incidência da regra prevista no art. 116 do Decreto-Lei nº 9.760/46 na presente situação, uma vez que tal dispositivo está atrelado à transferência de aforamento, sendo que a controvérsia versada nos autos vincula-se a imóvel inscrito na SPU sob o regime de ocupação”.
Em suas razões recursais (evento 57), a UNIÃO asseverou que “a obrigação de requerer a transferência dos registros cadastrais perante à SCGPU se aplica a todas as modalidades de transferência do domínio útil e do direito de ocupação”, o que teria sido ressaltado na Instrução Normativa no 1, de 9 de março de 2018.
Alegou, ainda, que “a multa impugnada incide nos casos de alienações não onerosas do domínio útil ou do direito de ocupação, porque nessas também persiste para o adquirente a obrigação de requerer ao órgão local da SCGPU, no prazo máximo de sessenta dias, que providencie a transferência dos registros cadastrais para o seu nome”.
Por fim, sustentou que o laudêmio e multa são institutos distintos, não havendo relação de acessoriedade entre eles.
Contrarrazões dos autores (evento 69), pugnando pela manutenção integral da sentença. Salientaram, preliminarmente, pelo não conhecimento do recurso diante da violação ao princípio da dialeticidade, já que a “recorrente simplesmente repetiu ispis literis os fundamentos contidos na contestação de Evento 36 dos autos eletrônicos”.
Também aduziram que “a multa é aplicada apenas aos casos em que é devido o pagamento de laudêmio, ou seja, em hipótese de transferência onerosa entre vivos” e, no caso, “não há pagamento de laudêmio, pois os apelados herdaram o bem, tratando de transferência não onerosa, também não sendo devido o pagamento da multa”.
Ressaltaram que “a interpretação de normas sancionatórias deve ser restritiva, não sendo permitido estender a interpretação visando abarcar hipóteses não tipificadas na norma sancionatória”.
Aduziram que a instrução normativa nº 1, de 9 de março de 2018, além de ser hierarquicamente inferir ao Decreto-Lei 2398/87, é posterior ao pedido dos requerentes para que o imóvel por eles herdado fosse transferido para suas titularidades, evidenciando a sua inaplicabilidade ao caso em comento.
Afirmaram, ao final, que “quanto ao valor da multa, é inequívoca a sua desproporcionalidade e o seu caráter confiscatório, tendo em vista que ela é extraordinariamente superior ao valor que seria pago a título de laudêmio, caso este fosse devido, situação em que seria aplicável precedente do STF – ADI551”, e, “caso mantida a aplicação da multa, a fim de que esta fosse reduzida a patamares razoáveis, já que em muito superior ao laudêmio que seria devido, caso a transmissão na situação presente fosse onerosa”.
Parecer do Ministério Público Federal (evento 5), pela não intervenção no feito.
É o relatório. Peço inclusão em pauta.
Documento eletrônico assinado por ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20000541756v3 e do código CRC 39b8bd32.
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Signatário (a): ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES
Data e Hora: 20/6/2021, às 19:53:18