Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0197568-59.2017.4.02.5101/RJ

RELATOR: Desembargador Federal WANDERLEY SANAN DANTAS

APELANTE: GILBERTO POZZAN

APELADO: INDUSTRIA DE ALIMENTOS MONTEIRO LTDA

APELADO: INPI-INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por GILBERTO POZZAN contra a sentença proferida pelo MM. Juízo da 9ª Vara Federal do Rio de Janeiro/RJ, que julgou improcedente o pedido de anulação do ato de anulação do registro  nº 902.725.084, da marca nominativa "BATALHA", destinado a assinalar produtos da classe 33 (NCL-8) - “vinho; bebidas alcoólicas contendo frutas; vinho de fruta; bebidas alcoólicas [exceto cerveja]”; depositado em 24/06/2010, em razão da anterioridade do registro n. 825.367.972, relativo à marca mista BATALHA, de titularidade da ré - INDÚSTRIA DE ALIMENTOS MONTEIRO LTDA, destinado a assinalar produtos da classe NCL (8) 29, especificados como “laticínios”, cujo depósito do pedido ocorreu em 08/04/2003 processo 0197568-59.2017.4.02.5101/RJ, evento 32, SENT32.

Em suas razões, aduz o apelante, em síntese, que não se verifica a colidência entre as marcas, eis que, embora referentes a produtos alimentícios, estes são suficientemente distintos - vinhos e laticínios, não havendo potencial de confusão no mercado consumidor. Argumenta, ainda, que o termo "BATALHA" já foi deferido para outras marcas igualmente do ramo alimentíco, o que denotaria a possibilidade de coexistência entre as marcas no mercado processo 0197568-59.2017.4.02.5101/RJ, evento 36, OUT28.

Foram apresentadas contrarrazões pelo INPI processo 0197568-59.2017.4.02.5101/RJ, evento 42, OUT31 .

O MPF opinou, em seu parecer, pelo não provimento do recurso evento 7, OUT6.

É o relatório. Incluam-se em pauta para julgamento.

 



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Processo n. 0197568-59.2017.4.02.5101
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0197568-59.2017.4.02.5101/RJ

RELATOR: Desembargador Federal WANDERLEY SANAN DANTAS

APELANTE: GILBERTO POZZAN

APELADO: INDUSTRIA DE ALIMENTOS MONTEIRO LTDA

APELADO: INPI-INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

VOTO DIVERGENTE

De início, adoto o relatório do Exmo. Relator, Desembargador Federal WANDERLEY  SANAN DANTAS.

O cerne do recurso consiste em decidir se a anterioridade da marca mista “BATALHA” da ré/apelada,  INDÚSTRIA DE ALIMENTOS MONTEIRO LTDA – ME, tem o condão de impedir a marca nominativa “BATALHA” do autor/apelante,  GILBERTO POZZAN.

Para a análise  da  semelhança das marcas em cotejo com o  fim de aferir a possibilidade de confusão ao público consumidor, se faz necessário o exame dos respectivos produtos ofertados pelas empresas litigantes num contexto fático-probatório.

A noção de confusão deriva da natureza do produto e/ou do serviço, de modo que o julgador  formará a sua convicção com a análise de todos os elementos que venham a corroborar para a certeza da afinidade e semelhança das marcas.

A ré/apelada, INDÚSTRIA DE ALIMENTOS MONTEIRO LTDA – ME, possui o seguinte registro marcário:

- nº 825.367.972: relativo à marca mista “BATALHA”, classe NCL (8) 29 (Carne, peixe, aves e caça; extratos de carne; frutas, legumes e verduras em conserva, secos e cozidos; geléias, doces e compotas; ovos, leite e laticínio; óleos e gorduras comestíveis), com a seguinte especificação: “laticínios”, depositado em 08/04/2003, com a seguinte imagem:

             

                         

O autor/apelante, GILBERTO POZZAN, possui o seguinte registro marcário:

- nº 902.725.084: relativo à marca nominativa “BATALHA”, classe NCL(9)33 (Bebidas alcoólicas  - exceto cervejas), com a seguinte especificação: “Vinho; Bebidas alcoólicas contendo frutas;Vinho de fruta;Bebidas alcoólicas - exceto cerveja”, depositado em 24/6/2010

 

De plano verifica-se a impossibilidade de coexistência das marcas em cotejo, consoante os pontos a seguir destacados:

- Evidente identidade gráfica das marcas ("BATALHA");

- A empresa ré/apelada atua na área de laticínios e, como se constata no evento 1, OUT7,  produz vários tipos de queijos;

- O autor/apelante tem seu segmento voltado para a fabricação de vinhos, consoante se constata no evento 1, OUT6.

Com efeito, há uma cultura e tradição na harmonização do queijo com o vinho. Ambos sempre estiveram intimamente ligados. Basta uma simples pesquisa na internet (google) pra encontrar diversos sites, bolgs, etc justamente direcionados para essa cultura:

Harmonização de Queijos e Vinhos | Winepedia

https://www.wine.com.br › harmonizacao-de-a-a-w › q...

Conheça os melhores tipos de queijo para comer com vinho

https://content.paodeacucar.com › tipos-de-queijo-para-.

Queijos para comer com vinho: saiba como harmonizar

http://blog.chefsclub.com.br › 5-tipos-queijo-harmoniz.

Como Harmonizar Queijos e Vinhos? - DiVinho

https://www.divinho.com.br › blog › como-harmonizar.

 

Portanto, neste caso específico,  a convivência das marcas em cotejo certamente acarreta confusão ao consumidor que poderá entender que ambos produtos se originam de uma única empresa. Saliente-se que o fato da marca da ré/apelada ser mista não afasta a possibilidade de confusão, notadamente diante da natureza nominativa da marca da apelante.  

  A  proibição  de reprodução ou imitação de marca alheia está regulamentada através do art. 124, XIX, da LPI, in verbis:

“Art. 124 – Não são registráveis como marca: (...)

(...)

XIX – reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia registrada, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia; (...)”

 

Assim, correta a sentença ao consagrar o entendimento no sentido de que:

“Merece acolhida, assim, o exposto no elucidativo e fundamentado parecer técnico da Coordenação-Geral de Recursos e Processos Administrativos de Nulidade do INPI de fls. 75/77, que reexaminou a questão em tela com base nos elementos trazidos aos autos pelo Autor, na aludida Lei n. 9.279/96 e na documentação constante do cadastro da Autarquia Ré, nos seguintes termos:

“Ao reexaminarmos o processo em comento, verifica-se que se trata de disputa entre empresas pela exclusividade de uso do sinal “BATALHA”, utilizado para distinguir produtos alimentícios, quais sejam, laticínios e vinhos. Convém notar-se que o INPI tem-se posicionado por não permitir a convivência de sinais marcários idênticos ou semelhantes, que visem a distinguir gêneros alimentícios, em especial aqueles encontrados em supermercados. Ao examinar a nulidade do registro em tela, o examinador do INPI acertadamente impediu a convivência entre os sinais em litígio, pois considerou o alto risco, não de confusão, mas sim, de associação entre os mesmos, o que poderia prejudicar o processo de escolha dos consumidores e possibilitar a configuração de atos de concorrência desleal e aproveitamento parasitário entre as empresas. O citado risco de associação torna-se ainda mais presente, no caso em cotejo, pelo fato de serem os sinais formados pela expressão única e singular (“BATALHA”), o que lhes confere alto grau de distintividade, tornando mais fácil sua fixação pelo consumidor. Portanto, na prática, o consumidor do vinho da marca “BATALHA” poderá associar (indevidamente) a origem desta com a marca de laticínios “BATALHA. Logo, se os laticínios BATALHA forem reconhecidos como de excelente qualidade, os vinhos BATALHA poderão se aproveitar parasitariamente de tal “fama”; a contrario sensu, se os mesmos laticínios BATALHA tiverem péssima reputação, os produtores do vinho BATALHA poderão ser prejudicados em suas vendas.

Quanto à presença de sinais contendo o termo “Batalha” (“AZEITE BATALHA DA GUARDA VELHA” e “BATALHA DAS MAÇÃS”), para assinalar produtos alimentícios – o que, segundo a empresa Autora, poderia justificar a manutenção de seu registro marcário -, deve-se ressaltar que tais marcas tiveram seu deferimento autorizado, porque são formadas por termos compostos, em que a expressão “Batalha” encontra-se associada a outras, diferentemente das marcas das empresas litigantes, que se caracterizam pela presença exclusiva do termo “Batalha”. Portanto, na disputa entre marcas idênticas, contendo a expressão “BATALHA” e concorrendo em segmento de mercado afim, prevalecerá a que primeiro foi depositada no INPI.”

VOTO NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, MANTENDO A SENTENÇA NA ÍNTEGRA, MAJORANDO OS HONORÁRIOS EM 1% (UM POR CENTO), POR FORÇA DO  ART. 85, §11 DO CPC/2015.

 



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RELATOR: Desembargador Federal WANDERLEY SANAN DANTAS

APELANTE: GILBERTO POZZAN

APELADO: INDUSTRIA DE ALIMENTOS MONTEIRO LTDA

APELADO: INPI-INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

EMENTA

PROPRIEDADE INDUSTRIAL. DIREITO MARCÁRIO. MARCA MISTA. MARCA NOMINATIVA. "BATALHA". USO DE EXPRESSÃO NOMINATIVA COMPONENTE DE MARCA MISTA ANTERIORMENTE REGISTRADA. NULIDADE DE REGISTRO DECLARADA PELO INPI EM SEDE DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 124, INCISO XIX, DA LPI. REPRODUÇÃO DE MARCA ANTERIOR. POSSIBILIDADE DE COEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE RISCO DE CONFUSÃO OU ASSOCIAÇÃO INDEVIDA. AUSÊNCIA DE APROVEITAMENTO PARASITÁRIO. RAMO MERCADOLÓGICO ALIMENTÍCIO. SEGMENTOS ESPECÍFICOS. LATICINIOS E PRODUTOS VINÍCOLAS. NULIDADE DA ANULAÇÃO DO REGISTRO. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA.

1 - A distintividade é condição essencial para o registro de uma marca, motivo pelo qual o artigo 124 da Lei n. 9.279/96 enumera vários sinais não registráveis, tais como os de uso comum, genérico, vulgar ou meramente descritivos, porquanto desprovidos de um mínimo diferenciador que justifique sua apropriação a título exclusivo. 

2 - As marcas registráveis podem apresentar diversos graus de distintividade. Assim, fala-se em marcas de fantasia, marcas arbitrárias e marcas evocativas (também chamadas de sugestivas ou fracas). (REsp n. 1.336.164/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 7/11/2019, DJe de 19/12/2019.)

3 - Para configurar eventual violação de marca anteriormente registrada, afigura-se imprescindível que o uso dos sinais distintivos impugnados possa ensejar concorrência desleal, desvio de clientela e causar confusão no público consumidor ou associação errônea, em prejuízo ao titular da marca supostamente infringida. (REsp n. 1.908.170/RJ, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 10/12/2020, DJe de 18/12/2020.) 

4 - Consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, marcas dotadas de baixo poder distintivo, formadas por elementos de uso comum, evocativos, descritivos ou sugestivos, podem ter de suportar o ônus de coexistir com outras semelhantes. (REsp n. 1.908.170/RJ, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 10/12/2020, DJe de 18/12/2020.)

5 - Em razão do baixo grau de distintividade da marca evocativa - aquela constituída por expressão que lembra ou sugere finalidade, natureza ou outras características do produto ou serviço desenvolvido pelo titular -, a regra da exclusividade do registro é mitigada e seu titular deverá suportar o ônus da convivência com outras marcas semelhantes, desde que não se constate, por óbvio, a possibilidade de confusão no público consumidor. (REsp n. 1.336.164/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 7/11/2019, DJe de 19/12/2019.)

6 - O exame da existência de confusão ou de associação de marcas deve ter como parâmetro, em regra, a perspectiva do homem médio (homo medius), ou seja, do ser humano razoavelmente atento, informado e perspicaz, o que não afasta avaliação diferenciada a depender do grau de especialização do público-alvo do produto ou do serviço fornecido (REsp 1.342.741/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 05.05.2016, DJe 22.06.2016).

7 - Não há como o homem médio fazer qualquer espécie de confusão ou mesmo associação dos laticínios "BATALHA" com os vinhos "BATALHA". Embora o ramo mercadológico principal seja o alimentício, a subespécie laticínios é suficientemente distinta da subespécie vinhos. 

8 - Ademais, há que se considerar o conjunto marcário na análise da potencial colidência entre as marcas. Não se pode fragmentar a análise da marca a ponto de quebrar sua unidade e a forma pela qual o público consumidor a percebe, sendo de rigor que se proceda a uma análise global do conjunto. (REsp n. 1.924.788/RJ, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 8/6/2021, DJe de 11/6/2021.)

9 - A proteção que o registro marcário visa a conferir ao titular da marca comercial é quanto ao seu conjunto. A despeito de o aproveitamento parasitário ser repelido pelo ordenamento jurídico pátrio, independentemente de registro, tal circunstância é de ser aferida a partir do cotejo, pelo conjunto, das marcas comerciais, sendo desimportante o elemento nominativo, individualmente considerado, sobretudo nas marcas de configuração mista. (REsp n. 1.237.752/PR, relator Ministro Luis Felipe Salomão, relator para acórdão Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 5/3/2015, DJe de 27/5/2015.)

10 - No caso em apreço, o conjunto visual das marcas em questão é consideravelmente distinto, o que afasta por completo a possibilidade de indevida associação ou confusão pelo consumidor tão somente pelo uso comum da expressão nominativa "BATALHA". A proteção conferida à marca mista dos laticínios Batalha não incide sobre a expressão marcária "BATALHA" de forma isolada, mas sim, indissociavelmente, sobre o conjunto marcário, em que são indispensáveis os elementos gráficos, de modo que o uso da expressão nominativa "BATALHA" para designar produtos vinícolas não enseja risco de confusão ou de indevida associação entre as marcas, nem pode ser considerado aproveitamento parasitário.

11 - Tendo em vista que o INPI figurou como réu na presente ação, bem como que se posicionou de forma contrária ao pedido autoral, deve ser invertida a sucumbência para que condenado em custas e honorários advocatícios, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos moldes do art. 85 do CPC/2015.

12 - Recurso de apelação conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2a. Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por maioria, vencido o Desembargador Federal FLAVIO OLIVEIRA LUCAS, dar provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto do relator, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 03 de outubro de 2022.



Documento eletrônico assinado por WANDERLEY SANAN DANTAS, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20001131050v3 e do código CRC aa768706.

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