Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0131942-93.2017.4.02.5101/RJ

RELATOR: Desembargadora Federal CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA

APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)

APELADO: ASSOCIACAO ISRAELITA DE ENSINO E CULTURA (AUTOR)

APELADO: ASSOCIACAO ISRAELITA DE ENSINO E CULTURA (AUTOR)

APELADO: ASSOCIACAO ISRAELITA DE ENSINO E CULTURA (AUTOR)

RELATÓRIO

1. Trata-se de Apelação interposta pela UNIÃO FEDERAL em face da r. sentença proferida pelo Juízo da 6ª Vara Federal do Rio de Janeiro, que, nos autos de Ação de Procedimento Comum, julgou procedente, em parte, o pedido formulado para declarar a inexistência de relação jurídico-tributária entre a parte autora e a UNIÃO, no que tange às contribuições sociais e PIS/COFINS a contar do requerimento para concessão do CEBAS, eis que a entidade autora goza da imunidade prevista no art. 195, § 7º da CRFB/88, bem como para condenar a UNIÃO à devolução dos valores recolhidos indevidamente a título das contribuições previstas no art. 195, I, "a" e "b", da CRFB/88, referentes às contribuições para seguridade social e ao PIS e à COFINS (i) no período de 05/2012 a 31/12/2014; e (ii) a partir de 01/01/2015, em razão do cumprimento dos requisitos do art. 14 do CTN, conforme destacado na perícia, em razão do recolhimento indevido pago a título das contribuições previstas no art. 195, I, "a" e "b", da CRFB/88 no período que foi objeto da perícia, acrescidos da taxa Selic (Eventos 167, 182 e 197, dos autos originários).

2. A r. sentença reconheceu que os requisitos legais para o gozo da imunidade prevista no art. 195, § 7º da CRFB/88 são aqueles previstos no art. 14 do Código Tributário Nacional e que, na hipótese dos autos, os requisitos foram devidamente cumpridos, conforme conclusão do i. Perito, e que compete à Administração Tributária a devida fiscalização, a qual caberia o ônus de comprovar eventual irregularidade (evento 97, complementado nos eventos 119 e 145, dos autos originários).

3. Em suas razões recursais, a apelante alega que: (i) a ação foi ajuizada objetivando o direito à imunidade prevista no art. 195, § 7º, da CRFB, em relação às contribuições para a seguridade social; (ii) a questão acerca do preenchimento, ou não, dos requisitos legais para usufruir da imunidade foi levada ao Judiciário antes do procedimento de fiscalização; (iii) houve o pagamento dos tributos ora questionados, cujos valores se pretende a restituição, sem que tivesse sido dada a oportunidade de a Administração Tributária proceder à fiscalização conforme os arts. 195 e 197 do CTN; (iv) não foi determinado ao i. Perito a análise dos comprovantes fiscais que lastreiam os registros contábeis; (v) não foram observados os princípios da ampla defesa e do devido processo legal, sendo certo que os arts. 477 e 479 do CPC determinam que o i. Perito tem o dever de esclarecer ponto sobre o qual exista divergência; (vi) o autor deveria apresentar todos os documentos que comprovem o cumprimento dos requisitos para usufruir do benefício da imunidade; (vii) na ADIN 2.028, o C. STF reconheceu a constitucionalidade da previsão, em lei ordinária, de requisitos procedimentais para o gozo da imunidade; (viii) a Constituição Federal, quando quis excepcionar o princípio da universalidade do financiamento da Seguridade Social, o fez expressamente no § 7º do art. 195, ao isentar as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei; (ix) os aspectos meramente procedimentais referentes à certificação, fiscalização e controle continuam passíveis de definição em lei ordinária; (x) há a exigência da instituição ser detentora do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS); (xi) o E. STJ reconhece ser legítima a exigência de certificação para fins de fruição do art. 195, § 7º, da CFRB, nos termos da Súmula 352; (xii) o autor afirma ter sido intimado da decisão de 05/2017 do Ministério da Educação e Cultura que indeferiu o requerimento de renovação do seu Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS), em razão do "descumprimento de requisitos legais constantes da Lei 12.101/2009"; (xiii) não há que se falar em inconstitucionalidade material da Lei nº 12.101/2009, por restringir de forma desproporcional e desarrazoada o gozo da imunidade; (xiv) não pode o Juiz conceder benefício tributário não previsto em lei; (xv) com relação à condenação a restituir o indébito tributário, os valores pagos antes de 07/06/2012 estão prescritos, tendo em vista que a ação foi ajuizada em 07/06/2017; (xvi) a compensação deve observar a Lei nº 11.457/2007 (Evento 204, dos autos originários).

4. Em suas contrarrazões, a apelada requer o desprovimento do recurso, prestigiando a r. sentença, e alega que: (i) o STF decidiu que descabe à lei ordinária, aos regulamentos ou qualquer outra espécie de ato normativo diverso de lei complementar, criar outros requisitos adicionais e impertinentes que dificultem a comprovação ou extrapolem as exigências do art. 14 do CTN; (ii) os laudos periciais dos Eventos 97 e 119 se basearam em robusta documentação fiscal e foram conclusivos quanto ao cumprimento dos aspectos procedimentais previstos na Lei nº 12.101/2009 pela apelada, além daqueles de ordem material previstos no art. 14 do CTN; (iii) exigências de cunho material não poderiam ser instituídas por lei ordinária, a teor da previsão do art. 146, II, da CRFB/88, o que culminou na decisão administrativa que, de forma indevida, negou o seu pedido de renovação do CEBAS; (iv) a jurisprudência do E. STJ é firme no sentido de que, para os fins da imunidade do art. 195, § 7º, da CRFB/88, "a escrituração exigível nos termos do inciso III do art. 14 do CTN é aquela fundada em um instrumento ou meio adequado para verificar, com exatidão, que os demais requisitos constantes nos incisos I e II estão sendo cumpridos"; (v) toda a documentação fiscal foi enviada à apelante, cf. comprova a petição e os documentos de Evento 48 e, apesar disso, a apelante jamais apontou irregularidade nos registros e escriturações da apelada, ou mesmo qualquer aspecto que a impedisse de analisar o cumprimento dos critérios estabelecidos no art. 14 do CTN; (vi) as formalidades exigidas pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC) não são critérios determinantes para a apuração do cumprimento das exigências determinadas pelo CTN e, consequentemente, para o reconhecimento da imunidade constitucional; (vii) a sentença, ao mencionar "05/12" remete, tão somente, à competência do recolhimento efetuado por meio da GPS, sendo que o efetivo pagamento ocorreu em 19/06/2012, dentro do lapso prescricional de 5 anos, logo não há fundamento para reforma da sentença por ofensa ao art. 168, do CTN; (viii) os créditos discutidos somente se tornarão definitivos, líquidos e certos por ocasião do seu trânsito em julgado, ou seja, em período posterior à vigência do eSocial, não se aplicando, assim, o óbice da Lei nº 13.670/2018 (Evento 214, dos autos originários).

5. O Ministério Público Federal manifestou-se pela não intervenção no feito (Evento 6).

É o relatório. Peço dia para julgamento.

VOTO

1. Presentes os seus pressupostos de admissibilidade, conheço da Apelaçãoque merece desprovida, bem como da Remessa Necessária tida por interposta.

2. A matéria controvertida neste recurso limita-se à análise (i) da alegação de nulidade na r. sentença, por ofensa aos princípios da ampla defesa e do contraditório; (ii) dos requisitos para o reconhecimento do direito à imunidade prevista no art. 195, § 7º, da Constituição Federal; (iii) da possibilidade de exigência de outros requisitos além daqueles previstos no art. 14 do CTN; (iv) da alegação de inconstitucionalidade da Lei nº 12.101/2009; (v) se a r. sentença concedeu a repetição de indébito de valores atingidos pela prescrição, conforme o art. 168 do CTN; (vi) se houve ofensa à norma prevista na Lei nº 11.457/2007, que limita a compensação de contribuições sociais.

3. Imunidade tributária estabelecida no art. 195, § 7º abrange a Contribuição ao PIS - Tema 432

O C. STF, ao julgar o RE nº 636.941/RS, sob o regime de repercussão geral (Tema 432), decidiu que:

A imunidade tributária prevista no art. 195, § 7º, da Constituição Federal abrange a contribuição para o PIS.

4. CEBAS -  Tema 32 do C. STF 

Inicialmente, cumpre mencionar a firme orientação do C. STF acerca da constitucionalidade da exigência de emissão e renovação do Certificado ou do Registro de Entidade de Fins Filantrópicos - CEFF, fornecido pelo Conselho Nacional de Serviço Social, o qual, após a MP nº 2.187-13/2001, passou a receber a nomenclatura de Registro e do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS, valendo transcrever a ementa do seguinte julgado, in verbis:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. CERTIFICADO DE ENTIDADE BENEFICENTE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL - CEBAS. RENOVAÇÃO PERIÓDICA. CONSTITUCIONALIDADE. DIREITO ADQUIRIDO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal se consolidou no sentido de que não ofende a Constituição Federal a exigência de emissão e renovação periódica de Certificado de Entidade Filantrópica para fazer jus à imunidade tributária, nos termos do art. 55, II, da Lei 8.212/91. 2. Não há razão jurídica em se pleitear o direito à imunidade por prazo indeterminado, mediante a renovação indefinida do certificado de entidade beneficente de assistência social, porquanto inexiste direito adquirido a regime jurídico. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (RMS 23368 AgR - STF-  Primeira Turma, Relator: Min. EDSON FACHIN, Julgamento: 24/11/2015, Publicação: 10/12/2015).

Mencione-se, ainda, que, no julgamento do RE nº 566.622/RS, sob o regime da repercussão geral, o Colendo Supremo Tribunal Federal fixou a tese de que “os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar”, interpretando-se o art. 195, § 7º da CF a partir da determinação prevista no art. 146, II, da CF, na qual cabe àquela espécie legislativa a regulamentação de limitações constitucionais ao poder de tributar.

Nesse contexto, a nova redação da tese do Tema nº 32 da repercussão geral passou a ser a seguinte:

"A lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas"

Além disso, no julgamento conjunto dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 566.622 e das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nºs. 2.028, 2.036, 2.228 e 2.621, o C. STF reconheceu a constitucionalidade do art. 55, II, da Lei nº 8.212/1991, na redação original e nas posteriores, que exigia, originalmente, o Certificado ou do Registro de Entidade de Fins Filantrópicos - CEFF, fornecido pelo Conselho Nacional de Serviço Social, o qual, após a MP nº 2.187-13/2001, passou a receber a nomenclatura de Registro e do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS.

Confira-se a ementa do julgado:

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO SOB O RITO DA REPERCUSSÃO GERAL. TEMA Nº 32. EXAME CONJUNTO COM AS ADI’S 2.028, 2.036, 2.228 E 2.621. ENTIDADES BENEFICENTES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. IMUNIDADE. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. ARTS. 146, II, E 195, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA. CARACTERIZAÇÃO DA IMUNIDADE RESERVADA À LEI COMPLEMENTAR. ASPECTOS PROCEDIMENTAIS DISPONÍVEIS À LEI ORDINÁRIA. OMISSÃO. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 55, II, DA LEI Nº 8.212/1991. ACOLHIMENTO PARCIAL. 1. Aspectos procedimentais referentes à certificação, fiscalização e controle administrativo são passíveis de definição em lei ordinária, somente exigível a lei complementar para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas no art. 195, § 7º, da Lei Maior, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas. 2. É constitucional o art. 55, II, da Lei nº 8.212/1991, na redação original e nas redações que lhe foram dadas pelo art. 5º da Lei 9.429/1996 e pelo art. 3º da Medida Provisória nº 2.187-13/2001. 3. Reformulada a tese relativa ao tema nº 32 da repercussão geral, nos seguintes termos: ‘A lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas.’ 4. Embargos de declaração acolhidos em parte, com efeito modificativo" (DJe 11.5.2020) - grifos nossos.

Nesse contexto, conforme decidido pelo C. STF, o gozo da imunidade tributária prevista no art. 195, §7º, da CRFB/88, enquanto não editada nova lei complementar sobre o tema, dependeria do implemento dos requisitos materiais previstos no art. 14 do CTN, concomitantemente com o requisito procedimental para certificação, fiscalização e controle, previsto em lei ordinária (art. 55, II da Lei nº 8.212/91, na sua redação original, ou art. 29 da Lei nº 12.101/09), devendo a entidade possuir o CEBAS.

A LC nº 187, publicada em 17 de dezembro de 2021, e que entrou em vigor na data de sua publicação, trata da certificação das entidades beneficentes e dos procedimentos relativos à imunidade de que cuida o §7º do art. 195 da Constituição Federal, encerrando-se a discussão acerca da ausência de lei complementar sobre imunidade tributária.

Ou seja, a partir de 17/12/2021, data da publicação da mencionada Lei Complementar, a concessão e a renovação do CEBAS passaram a ser regidas pela LC 187/2021, estando revogada a Lei nº 12.101, de 27 de novembro de 2009.

 Desde então, para o gozo da imunidade tributária, as entidades devem atender, cumulativamente, aos requisitos legais exigíveis previstos no art. 3º da LC 187/2021, e estarem devidamente "certificadas nos termos desta Lei Complementar", conforme expressamente previsto no caput do referido artigo.

Sendo assim, a Lei Complementar nº 187/2021 deixou claro que a certificação, através da obtenção do CEBAS não é dispensável para o reconhecimento ao direito à imunidade, como já vinha decidindo o C. STF.  

5. Da existência de requerimento de renovação do CEBAS

No presente caso, da análise do Estatuto Social, verifica-se que a autora é  associação civil, sem fins lucrativos, que atua na área da educação, com os seguintes objetivos previstos no seu Estatuto Social: 

"a) preservar e difundir a cultura universal, notadamente a brasileira e a judaica, a religião e as tradições israelitas; b) criar ou manter instituições educacionais de nível pré-escolar (maternal, jardim de infância), ensino fundamental, básico e médio, curso de habilitação para o magistério na modalidade Normal e cursos do ensino superior (faculdades de diferentes áreas), dentro dos princípios estabelecidos no item anterior; c) criar cursos, centro culturais e desportivos e bibliotecas para o desenvolvimento físico e espiritual dos seus associados e dependentes; d) manter em seus Estabelecimentos (conforme definição adiante) bolsas aos alunos carentes; e) realizar atendimento social, sem discriminação de etnia, gênero, orientação sexual e religiosa, bem como a portadores de deficiência."

Nota-se, ainda, a existência de cláusulas estatutárias que atendem às exigências constantes dos incisos I e II do art. 14 do CTN – arts. 52 e 53 do Estatuto Social, quais sejam, a não distribuição de qualquer parcela do patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título e aplicação integral, no País, dos recursos na manutenção dos objetivos institucionais (Evento 1, OUT3, pág. 15, dos autos originários).

Da análise dos documentos juntados, observa-se que, em 05/03/2015, foi deferido o Pedido de Renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social - CEBAS, com validade para o período de 01/01/2010 a 31/12/2014 (Evento 1, OUT4, dos autos originários).

A apelada informa que, em 26/11/2014, dentro do prazo legal, requereu a renovação do seu CEBAS (Evento 1, OUT6, dos autos originários)

Contudo, em 08/03/2017, a autora recebeu o Ofício nº 681/2017/DIAN/CG/DPR/SERE/SERES-ME, no qual lhe foi exigida a "complementação de documentos e informações para análise do requerimento de Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS". (Evento 1, OUT 7, dos autos originários).

Foram exigidos da autora os seguintes documentos, sob pena de indeferimento do pedido: (i) cadastro no SisCebas; (ii) Ata de Eleição dos Dirigentes da Entidade, com base no art. 3º. inc. II, do Decreto nº 7.237/2010; (iii) Autorização de Funcionamento da Instituição de Ensino, com fundamento no art. 29, inciso II, alínea "a", do Decreto nº 7.237/2010; (iv) Identificação do Corpo Dirigente da Instituição de Ensino, à luz do art. 29, inciso II, alínea "e", do Decreto nº 7.237/2010; (v) Regimento escolar da instituição de ensino, também com base no art. 29, inciso II, alínea "d", do Decreto nº 7.237/2010; (vi) Relatório de atividades desempenhadas pela mantenedora, com fundamento no art. 3º, inciso IV, do Decreto nº 7.237/2010; (vii) Relatório sintético da oferta de gratuidade; (viii) Relação de bolsas de estudo; (ix) Análise do perfil socioeconômico dos alunos bolsistas; (x) Relatórios de natureza contábil; (xi) Receita efetivamente recebida; (xii) Plano de atendimento na área de educação e (xiii) Inscrição dos serviços socioassistenciais.

Em 07/06/2017, a apelada ajuizou a presente ação tendo o Juízo a quo deferido, em parte, a tutela de urgência para determinar que a ré analisasse o pedido de reconhecimento da condição de entidade de assistência social da autora com base exclusivamente nas exigências previstas no art. 14, do CTN, afastando-se aquelas previstas na legislação ordinária (Evento 17, DESPADEC177, dos autos originários).

Em 04/10/2017, a autora foi intimada da decisão proferida pelo Ministério da Educação e Cultura - MEC que indeferiu o requerimento de renovação do seu Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS), "por contrariarem requisitos legais constantes da Lei nº 12.101/2009"

O Ministério da Educação oficiou ao MM Juiz a quo informando que, em atenção à decisão judicial proferida, reanalisou os autos do processo CEBAS da entidade, observando tão somente os requisitos previstos no artigo 14 do CTN, e manteve o indeferimento do CEBAS, por descumprimento do disposto no inciso III, do artigo 14 do CTN (Evento 85, OUT148, dos autos originários).

A conclusão a que chegou o Ministério da Educação foi que a autora não possuía escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão, segundo a Interpretação Técnica Geral (ITG) 2002 que exige que as informações relativas às gratuidades praticadas devem ser registradas de forma segregada, destacando aquelas que devem ser utilizadas na prestação de contas junto aos órgãos governamentais, apresentando dados quantitativos e qualitativos, ou seja, valores dos benefícios, número de atendidos, número de atendimentos, número de bolsistas com valores e percentuais representativos. A respeito deste item, no check-list que constou da Nota Técnica do Ministério da Educação, foi informado que "as informações exigidas não foram integralmente apresentadas em Notas Explicativas, como determina a norma contábil (Doc. SEI nº 0512930, pág. 100, item IV)".

Nesse sentido, conclui-se que o indeferimento do pedido de renovação do CEBAS se deu em razão do descumprimento dos requisitos previstos na Lei nº 12.101/2009, em específico aqueles relacionados ao "processo de seleção de bolsistas", à "identificação precisa dos beneficiários" e do "percentual de cada bolsa ofertada", "ao processo de seleção de bolsistas e à análise do perfil socioeconômico", a não demonstração do "quantitativo de alunos matriculados, pagantes e bolsistas integrais e parciais (...) para a devida apuração da proporção de distribuição de bolsas de estudo", dentre outros critérios de ordem estritamente material.

Vê-se, portanto que houve requerimento de renovação do CEBAS, inicialmente indeferido, sob o fundamento de ofensa à legislação ordinária, ainda que a UNIÃO tivesse sido intimada da decisão judicial para que apreciasse o requerimento apenas com base nas exigências previstas no art. 14, do CTN.

6. Demonstração do Preenchimento dos Requisitos Legais

Como visto, o C. STF, no julgamento do Tema 32 de Repercussão Geral, firmou o entendimento de que apenas Lei Complementar pode estabelecer requisitos para o reconhecimento da imunidade tributária (art. 14 do CTN ou art. 3º da LC nº 187/2021) - restando afastados os requisitos instituídos por Leis Ordinárias (Leis nº 8.212/91 e nº 12.101/09), as quais, por outro lado, podem dispor sobre certificação das entidades beneficentes de assistência social.

A hipótese em tela refere-se a período anterior à edição da LC nº 187/2021, sendo, portanto, aplicáveis os requisitos estabelecidos no CTN.

O art. 14 do CTN dispõe que a imunidade conferida às entidades beneficentes de assistência social é subordinada à observância dos seguintes requisitos: (I) não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; (II) aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais; e (III) manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

Já a Lei nº 12.101/09, vigente à época dos fatos narrados na inicial, dispõe sobre o procedimento para a certificação das entidades beneficentes de assistência social.

Observa-se, dos elementos dos autos, que a autora demonstrou o cumprimento do requisito procedimental exigido pela Lei nº 12.101/09, não se insurgindo a UNIÃO quanto ao ponto.

Vale dizer que, com relação à atualização do cadastro junto o SisCEBAS, tal exigência é relativizada pela UNIÃO como se extrai de informação constante do sítio eletrônico1 de que "após o cadastramento (no SisCEBAS), o pedido de certificação das entidades que atuarem preponderantemente na área da educação, poderá, excepcionalmente, ser protocolado em meio físico, durante o período de manutenção do SisCEBAS.".

A apelada esclareceu ainda que, na ocasião em que realizou o pedido de renovação de seu certificado, em 26/11/2014, o SisCEBAS encontrava-se inacessível, de modo que o pedido administrativo de renovação do CEBAS foi instruído e protocolado pela via física, como recomendado pelo MEC em situações semelhantes.

A controvérsia resume-se, portanto, ao requisito material disposto no inciso III do art. 14 do CTN e, para demonstrar o atendimento à exigência legal, a autora juntou balanços patrimoniais, demonstrações de resultado, demonstração das mutações do patrimônio líquido e demonstração do fluxo de caixa, parecer dos auditores independentes, livros diário, livros razão, DIPJ, bem como relativos aos exercício de 2017 e 2018, o balanço completo, livro diário, livro razão, DIPJ, DCTF e parecer dos auditores independentes. 

Para a análise dos referidos documentos foi realizada perícia judicial, cujo laudo e esclarecimentos constam dos Eventos 97 e 119, dos autos originários, bem como a resposta à impugnação da UNIÃO, no Evento 143, dos autos originários.

A respeito da prova pericial, destaca-se, inicialmente, que o i. Perito do Juízo, confirmou a conclusão do Ministério da Educação de que a escrituração contábil apresentada não atende ao previsto pelo Conselho Federal de Contabilidade - CFC (Norma ITG 2002 R1) referente à divulgação do quantitativo de gratuidades concedidas (nos termos do seu item 'm').

A fim de atender à exigência do Ministério da Educação, a autora passou a apresentar, desde 2017, notas explicativas detalhadas a respeito dos dados de gratuidades, conforme disposto em Resolução do CFC, as quais complementam as demonstrações financeiras. No entanto, a legislação não atribui às notas explicativas o condão de conferir exatidão às receitas ou despesas, nem são parte dos livros referidos no inciso III. (Evento 127, ANEXO2, dos autos originários)

Por outro lado, o Expert do Juízo afirma que a Demonstração de Resultado do Exercício de 2015 registra a concessão de gratuidades no valor de R$ 8.666.765,64 (oito milhões, seiscentos e sessenta e seis mil e setecentos e sessenta e cinco reais e sessenta e quatro centavos), o que representa o percentual de 20,06% da receita educacional.

No que se refere a este tema, o Colendo Supremo Tribunal Federal, no julgamento conjunto das ADIs 2028, 2036, 2228 e 2621 e do RE 566.622, declarou a inconstitucionalidade tanto do art. 2º, IV, do Decreto nº 752/932, como do art. 3º, VI, do Decreto nº 2.536/983, pois estabeleciam requisitos materiais para o gozo da imunidade que somente poderiam ser previstos em lei complementar.

Assim, a despeito da comprovação de que a entidade destina à concessão de gratuidades quantitativo superior a 20% da receita educacional, não se pode exigir do contribuinte requisito material previsto em norma infralegal.

Além disso, o i. Perito, em seu laudo, afirma categoricamente a regularidade da escrituração contábil da autora, como é possível extrair das respostas aos quesitos, contidas no laudo complementar (Evento 119):

(i) é possível afirmar que os livros contábeis apresentados são capazes de assegurar que a AUTORA NÃO efetua a distribuição de "qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título", nos termos do art. 14, I, do CTN?

Resposta: A resposta é positiva.

(ii) é possível afirmar que os livros contábeis apresentados são capazes de assegurar que a AUTORA APLICA "integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais", nos termos do art. 14, II, do CTN?

Resposta: A resposta é positiva.

(iii) com base nas resposas aos itens '(i)' e '(ii)' acima, é possível afirmar que os livros contábeis apresentados pela AUTORA são capazes de assegurar a exatidão da escrituração de suas receitas e despesas, considerando os critérios estabelecidos pelo art. 14, I e II, do CTN?

Resposta: A resposta é positiva.

A prova técnica demonstra que a documentação da autora atende aos requisitos previstos no art. 14 do CTN, não tendo apurado qualquer irregularidade na escrituração contábil capaz de infirmar a exatidão das receitas e despesas.

Em sua impugnação ao laudo pericial, a União não apresenta, minimamente, qualquer elemento apto a afastar a regularidade dos livros contábeis. Em verdade, o assistente técnico da União tece apenas esclarecimentos a respeito do procedimento de suspensão de imunidade, quando a fiscalização encontra irregularidades na entidade fiscalizada (Evento 126).

As conclusões do laudo pericial devem ser acatadas porque resultam de trabalho realizado por profissional da área, utilizando técnica e rigor científicos, ressaltando-se que o Perito é auxiliar do Juízo, em posição equidistante dos interesses das partes, razão pela qual suas conclusões devem ser prestigiadas à falta de elementos seguros em contrário.

7. Da ausência de violação ao contraditório e à ampla defesa

Não merece prosperar a alegação da União de que o i. Perito não teria auditado documentos que respaldariam a escrituração propriamente dita, o que, de fato, não se faz indispensável no caso em que não foram observados indícios que pudessem descredenciar os relatórios contábeis de profissionais de contabilidade registrados no órgão competente.

Ainda que tenha impugnado o fato de que "a perícia se limitou 'a simples verificação dos livros contábeis'", não houve pedido expresso para que o Juízo determinasse ao i. Perito a análise dos comprovantes fiscais que lastreiam os registros contábeis. 

Não é demais lembrar que cabe ao magistrado, que é o destinatário das provas, aferir se os elementos constantes dos autos são suficientes para formar a sua convicção, podendo indeferir, de forma fundamentada, diligências inúteis ou meramente protelatórias, nos termos do princípio do livre convencimento (art. 370, parágrafo único, do CPC).

Outrossim, não merece provimento o pedido para que esta Egrégia Turma determine a suspensão do processo para aguardar a realização de procedimento especial pela Receita Federal, em observância ao disposto no art. 32 da Lei 9.430/1996 e arts. 195 e 197 do CTN, pois compete ao Judiciário, com base nas provas dos autos, julgar a lide como proposta pelo autor, o que não afasta a competência da Administração para fiscalizar o cumprimento dos requisitos nos termos do art. 32 da Lei nº 9.430/1996.

Diante disso, merece ser confirmada a r. sentença que reconhece direito da autora à imunidade tributária.

8. Dos efeitos retroativos da imunidade.

O art. 31 da Lei nº 12.101/09, aplicável ao caso por ser a legislação vigente à época dos fatos, previa que os efeitos da imunidade teriam início com a publicação do ato de concessão do CEBAS. Todavia, tal dispositivo foi considerado formalmente inconstitucional pela Suprema Corte, no julgamento da ADI 4.4804.

No que diz respeito às entidades beneficentes da assistência social, nas palavras de Paulo de Barros, “a regra constitucional da imunidade tributária é uma norma de eficácia contida e de aplicabilidade condicionada, porquanto se exige uma efetiva comprovação de atendimento a exigências infraconstitucionais”5.

Sobre o tema, cabe ressaltar que o Egrégio Superior Tribunal de Justiça possui entendimento sumulado no sentido de que:

“O certificado de entidade beneficente de assistência social (CEBAS), no prazo de sua validade, possui natureza declaratória para fins tributários, retroagindo seus efeitos à data em que demonstrado o cumprimento dos requisitos estabelecidos por lei complementar para a fruição da imunidade”. (Súmula 612, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 9.5.2018, DJe 14.5.2018).

No caso sob exame, a autora protocolou o requerimento para renovação do CEBAS tempestivamente, em 26/11/2014 (Evento 1, OUT6, dos autos originários), o qual foi indeferido pela Portaria nº 1.036/2017, do Ministério da Educação, publicada em 02/10/2017 (Evento 48, OUT123, pág. 8, dos autos originários) e, após reapreciação com base exclusivamente nos requisitos do art. 14 do CTN, foi mantido o indeferimento pela Portaria nº 682/2018, do Ministério da Educação, publicada em 16/10/2018 (Evento 85, OUT148, pág. 13, dos autos originários).

Tendo em vista que o art. 3º do Decreto nº 8.242/2014, que regulamenta a Lei nº 12.101/09, dispõe que a certificação ou sua renovação será concedida à entidade que demonstre, no exercício fiscal anterior ao do requerimento, o cumprimento das exigências legais, conclui-se que, no ano de 2013 (exercício fiscal anterior ao do requerimento administrativo), a autora já tinha preenchido todas as exigências necessárias ao seu reconhecimento como entidade beneficente de assistência social, de modo que, desde então, faria jus à imunidade.

Nesse sentido, a jurisprudência do E. TRF da 2ª Região:

TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. ENTIDADE BENEFICENTE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL (APAE). CEBAS. NATUREZA DECLARATÓRIA. RETROAÇÃO DOS EFEITOS À DATA EM QUE DEMONSTRADO O CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS ESTABELECIDOS POR LEI COMPLEMENTAR PARA A FRUIÇÃO DA IMUNIDADE.

1. Trata-se de recurso de Apelação interposto pela UNIÃO FEDERAL/FAZENDA em face de sentença proferida pelo Juízo da 01ª Vara Federal de Colatina/ES, que, em ação ordinária, julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, para declarar a inexistência de relação jurídico-tributária no que diz respeito aos recolhimentos e pagamentos de contribuições ao Salário Educação, assim como todo o campo Contribuições aos Terceiros, sobre a folha de pagamento da parte autora, nos termos do art. 195, §7º, da Constituição Federal.

2. No que tange aos efeitos retroativos do CEBAS, em recente posicionamento sumulado, o Eg. Superior Tribunal de Justiça consagrou o entendimento de que os efeitos não se limitam à data do requerimento do certificado, mas sim à data do preenchimento dos requisitos legais para fruição da imunidade, em razão de sua natureza declaratória (Súmula 612). Precedentes desta Corte: TRF2- AC n° 0036848-64.2016.4.02.500, Rel. Desembargador Federal THEOPHILO ANTONIO MIGUEL FILHO, Terceira Turma Especializada, julgado em 16/05/2019, e-DJF2R 21/05/2019; TRF2- AC nº 0001429-67.2013.4.02.5104, Rel. Juíza Federal Convocada SANDRA CHALU BARBOSA, Quarta Turma Especializada, julgado em 11/10/2019, e-DJF2R 15/10/2019.

3. A parte Autora protocolou em 05/08/2014 o pedido administrativo de concessão do CEBAS. Considerando que o art. 3º do Decreto n° 8.242/2014, que regulamenta a Lei nº 12.101/09, dispõe que a certificação ou sua renovação será concedida à entidade que demonstre, no exercício fiscal anterior ao do requerimento, o cumprimento do disposto das exigências legais, isolada ou cumulativamente, conforme sua área de atuação, é de se concluir que no ano de 2013 (exercício fiscal anterior ao do requerimento administrativo em 05/08/2014) a parte Autora preencheu todas as exigências legais necessárias para o reconhecimento como entidade beneficente de assistência social.    

4. Devem ser reconhecidos efeitos ex tunc ao CEBAS concedido à autora, retroagindo seus efeitos à data em que demonstrado o cumprimento dos requisitos para a fruição da imunidade (a partir de 12/07/2013), e não da data da protocolo do requerimento do certificado (05/08/2014).

5. Apelação desprovida. Honorários majorados em 1% (um por cento).

(TRF2, Apelação Cível nº 5000608-08.2018.4.02.5005, 3a. Turma Especializada, Desembargador Federal Marcus Abraham, por unanimidade, julgado em 14/04/2020) - grifos nossos

9. Da prescrição para restituição do indébito

A sentença condenou a União à devolução dos valores recolhidos indevidamente a título das contribuições previstas no art. 195, I, "a" e "b", da CRFB/88, referentes às contribuições para seguridade social e ao PIS e à COFINS(i) no período de 05/2012 a 31/12/2014; e (ii) a partir de 01/01/2015, em razão do cumprimento dos requisitos do art. 14 do CTN, conforme destacado na perícia, em razão do recolhimento indevido pago a título das contribuições previstas no art. 195, I, "a" e "b", da CRFB/88 no período que foi objeto da perícia (Evento 97, complementado nos Eventos 119 e 145).

Acerca da prescrição para as ações de repetição de indébito tributário envolvendo tributos sujeitos a lançamento por homologação, tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Superior Tribunal de Justiça possuem jurisprudência firmada sob o rito da repercussão geral e dos recursos repetitivos, respectivamente.

Confira-se:

É inconstitucional o art. 4º, segunda parte, da Lei Complementar 118/2005, de modo que, para os tributos sujeitos a homologação, o novo prazo de 5 anos para a repetição ou compensação de indébito aplica-se tão somente às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9 de junho de 2005. (Tema 4 / STF)

Para as ações ajuizadas a partir de 9.6.2005, aplica-se o art. 3º, da Lei Complementar n. 118/2005, contando-se o prazo prescricional dos tributos sujeitos a lançamento por homologação em cinco anos a partir do pagamento antecipado de que trata o art. 150, § 1º, do CTN. (Tema 137 / STJ)

Portanto, nos termos do art. 168, I, do CTN, com a redação dada pela Lei Complementar nº 118/2005, o contribuinte tem o direito de pleitear a restituição ou compensação do indébito no prazo de 5 (cinco) anos, contados da data da extinção do crédito tributário - que, na hipótese, ocorreu pelo pagamento.

No caso em apreço, a autora ajuizou a presente ação em 07/06/2017, de sorte que está prescrita a pretensão de restituição das contribuições recolhidas antes de 07/06/2012

10.  Da atualização do indébito

O art. 39, §4º, da Lei nº 9.250/95 estabelece que “a partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada”.

Na atualização de indébito tributário, aplica-se tão-somente a taxa SELIC a partir de 1º de janeiro de 1996, consoante orientação da Primeira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.111.175/SP, submetido ao regime do art. 543-C do CPC.

Como a taxa SELIC já compreende atualização monetária e juros, não pode ser cumulada com qualquer outro índice.

11. Compensação 

O art. 74 da Lei n° 9.430/96 permite a compensação de crédito apurado pelo contribuinte relativo a tributo administrado pela Receita Federal, passível de restituição ou ressarcimento, com débitos relativos a quaisquer tributos também administrados pelo mesmo órgão administrativo.

Este TRF da 2ª Região vem seguindo a orientação firmada pelo E. STJ no REsp Repetitivo nº 1.164.452/MG (Tema 345), no sentido de que “a lei que regula a compensação tributária é a vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte”, ficando a operação sujeita aos procedimentos administrativos da Secretaria da Receita Federal do Brasil – SRF.

Dessa forma, deve ser reconhecido o direito da parte autora de efetuar a compensação dos valores indevidamente recolhidos, na forma da legislação vigente no encontro de contas, observado o art. 170-A do CTN, bem como o prazo prescricional quinquenal, nos termos do art. 168, I, do CTN.

Quanto ao ponto, a r. sentença sequer tratou da questão, a despeito do pedido inicial para que fosse declarado o direito à restituição ou à compensação, sendo certo que, conforme a orientação firmada pelo E. STJ no Tema 345, a compensação deve observar a legislação vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte.

12. Majoração dos honorários recursais

Nos termos da jurisprudência do E. STJ, para a majoração dos honorários, exige-se que o recurso tenha sido interposto em face de sentença publicada após a vigência do CPC/2015, que haja imposição de verba honorária pela instância ordinária, devendo-se, ainda, na aferição do montante a ser arbitrado, levar em consideração o trabalho desenvolvido pelo patrono da parte recorrida e os requisitos previstos nos §§2º a 10 do art. 85 do CPC/20156.

Assim, os honorários advocatícios anteriormente fixados na sentença devem ser majorados em 1% (um por cento), na forma do art. 85, §11, do CPC/15.

13. Conclui-se que a apelação merece ser desprovida,  majorando em 1% (um por cento) os honorários advocatícios anteriormente fixados na sentença, nos termos do art. 85, §11 do CPC.

Ante o exposto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO à Apelação da UNIÃO, majorando em 1% os honorários advocatícios anteriormente fixados na sentença, nos termos do art. 85, § 11 do CPC, ressalvando apenas a prescrição dos valores recolhidos indevidamente antes de 07/06/2012.



Documento eletrônico assinado por CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20001558452v5 e do código CRC 3a7b7362.

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Signatário (a): CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA
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1. https://cebas.mec.gov.br/perguntas-frequentes-cebas
2. Art. 2° Faz jus ao Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos a entidade beneficente de assistência social que demonstre, cumulativamente:...IV - aplicar anualmente pelo menos vinte por cento da receita bruta proveniente da venda de serviços e de bens não integrantes do ativo imobilizado, bem como das contribuições operacionais, em gratuidade, cujo montante nunca será inferior à isenção de contribuições previdenciárias usufruída
3. Art . 3º - Faz jus ao Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos a entidade beneficente de assistência social que demonstre, nos três anos imediatamente anteriores ao requerimento, cumulativamente:...VI - aplicar anualmente, em gratuidade, pelo menos vinte por cento da receita bruta proveniente da venda de serviços, acrescida da receita decorrente de aplicações financeira, de locação de bens, de venda de bens não integrantes do ativo imobilizado e de doações particulares, cujo montante nunca será inferior à isenção de contribuições sociais usufruída;
4. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=752454021.
5. CARVALHO, Paulo de Barros, Curso de Direito Tributário, 17ª Edição, Ed. Saraiva, São Paulo, 2005, p.192.
6. STJ - REsp: 1957671 SP 2021/0043601-0, Relator: Ministra REGINA HELENA COSTA, Data de Publicação: DJ 13/06/2022; AgInt no AgInt nos EDcl no AREsp 1.805.836/SP , Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 10/12/2021

 

Processo n. 0131942-93.2017.4.02.5101
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0131942-93.2017.4.02.5101/RJ

RELATOR: Desembargadora Federal CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA

APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)

APELADO: ASSOCIACAO ISRAELITA DE ENSINO E CULTURA (AUTOR)

APELADO: ASSOCIACAO ISRAELITA DE ENSINO E CULTURA (AUTOR)

APELADO: ASSOCIACAO ISRAELITA DE ENSINO E CULTURA (AUTOR)

EMENTA

TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. IMUNIDADE. ART. 195, § 7º DA CF/88. ENTIDADE BENEFICENTE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. PEDIDO DE RENOVAÇÃO DO CEBAS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. ART. 14 DO CTN. NATUREZA DECLARATÓRIA. RETROAÇÃO DOS EFEITOS À DATA EM QUE DEMONSTRADO O CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS ESTABELECIDOS POR LEI COMPLEMENTAR. COMPENSAÇÃO. DESPROVIMENTO.

1. Apelação em face de r. sentença que julgou  procedente, em parte, o pedido formulado, para declarar a inexistência de relação jurídico-tributária entre a parte autora e a UNIÃO, no que tange às contribuições sociais e PIS/COFINS a contar do requerimento para concessão do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS), eis que a entidade autora goza da imunidade prevista no art. 195, § 7º da CRFB/88, bem como condenar a UNIÃO à devolução das contribuições para seguridade social e ao PIS e à COFINS (i) no período de 05/2012 a 31/12/2014; e (iia partir de 01/01/2015, em razão do cumprimento dos requisitos do art. 14 do CTN, conforme destacado na perícia, em razão do recolhimento indevido pago a título das contribuições previstas no art. 195, I, "a" e "b", da CRFB/88 no período que foi objeto da perícia, acrescidos da taxa Selic.

2.  O C. STF, ao julgar o RE nº 636.941/RS, sob o regime de repercussão geral (Tema 432), decidiu que a imunidade tributária prevista no art. 195, § 7º, da Constituição Federal abrange a contribuição para o PIS.

3. O C. STF reconheceu a constitucionalidade do art. 55, II, da Lei nº 8.212/1991, na redação original e nas posteriores, que exigia, originalmente, o Certificado ou do Registro de Entidade de Fins Filantrópicos - CEFF, fornecido pelo Conselho Nacional de Serviço Social, o qual, após a MP nº 2.187-13/2001, passou a receber a nomenclatura de Registro e do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS (Tema 32). Nesse contexto, conforme decidido pelo C. STF, o gozo da imunidade tributária prevista no art. 195, §7º, da CRFB/88, enquanto não editada nova lei complementar sobre o tema, dependeria do implemento dos requisitos materiais previstos no art. 14 do CTN, concomitantemente com o requisito procedimental para certificação, fiscalização e controle, previsto em lei ordinária (art. 55, II da Lei nº 8.212/91, na sua redação original, ou art. 29 da Lei nº 12.101/09), devendo a entidade possuir o CEBAS.

4. O art. 14 do CTN dispõe que a imunidade conferida às entidades beneficentes de assistência social é subordinada à observância dos seguintes requisitos: (i) não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; (ii) aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais; e (iii) manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão. Já a Lei nº 12.101/09, vigente à época dos fatos narrados na inicial, dispõe sobre o procedimento para a certificação das entidades beneficentes de assistência social, bem como estabelece, em seu art. 29, requisitos para o gozo da imunidade.

5. No presente caso, da análise do Estatuto Social, verifica-se que a autora é  associação civil, sem fins lucrativos, que atua na área da educação, bem como verifica-se a presença de cláusulas estatutárias que atendem às exigências constantes dos incisos I e II do art. 14 do CTN – arts. 52 e 53 do Estatuto Social.

6. A autora demonstrou o cumprimento do requisito procedimental exigido pela Lei nº 12.101/09, não se insurgindo a UNIÃO quanto ao ponto. 

7. Em 05/03/2015, foi deferido o Pedido de Renovação do CEBAS, com validade para o período de 01/01/2010 a 31/12/2014. E, em 26/11/2014, dentro do prazo legal, a autora requereu a renovação do CEBAS. A presente ação foi ajuizada em 07/06/2017, após a autoridade fiscal exigir a complementação de documentos e informações para análise do requerimento de CEBAS. 

8. A controvérsia resume-se, portanto, ao requisito material disposto no inciso III do art. 14 do CTN e, para demonstrar o atendimento à exigência legal, a autora juntou balanços patrimoniais, demonstrações de resultado, demonstração das mutações do patrimônio líquido e demonstração do fluxo de caixa, parecer dos auditores independentes, livros diário, livros razão, DIPJ, bem como relativos aos exercício de 2017 e 2018, o balanço completo, livro diário, livro razão, DIPJ, DCTF e parecer dos auditores independentes. 

10. Para a análise dos referidos documentos, foi realizada perícia judicial, tendo o i. Perito a firmado categoricamente a regularidade da escrituração contábil da autor. A prova técnica demonstra que a documentação da autora atende aos requisitos previstos no art. 14 do CTN, não tendo apurado qualquer irregularidade na escrituração contábil capaz de infirmar a exatidão das receitas e despesas.

11. Não merece prosperar a alegação da União de que o i. Perito não teria auditado documentos que respaldariam a escrituração propriamente dita, o que, de fato, não se faz indispensável no caso em que não foram observados indícios que pudessem descredenciar os relatórios contábeis de profissionais de contabilidade registrados no órgão competente.

12. Cabe ao magistrado, que é o destinatário das provas, aferir se os elementos constantes dos autos são suficientes para formar a sua convicção, podendo indeferir, de forma fundamentada, diligências inúteis ou meramente protelatórias, nos termos do princípio do livre convencimento (art. 370, parágrafo único, do CPC).

13. O art. 3º do Decreto nº 8.242/2014, que regulamenta a Lei nº 12.101/09, dispõe que a certificação ou sua renovação será concedida à entidade que demonstre, no exercício fiscal anterior ao do requerimento, o cumprimento das exigências legais. Conclui-se que, no ano de 2013 (exercício fiscal anterior ao do requerimento administrativo), a autora já tinha preenchido todas as exigências necessárias ao seu reconhecimento como entidade beneficente de assistência social, de modo que, desde então, faria jus à imunidade.

14. Nos termos do art. 168, I, do CTN, com a redação dada pela Lei Complementar nº 118/2005, o contribuinte tem o direito de pleitear a restituição ou compensação do indébito no prazo de 5 (cinco) anos, contados da data da extinção do crédito tributário - que, na hipótese, ocorreu pelo pagamento. No caso em apreço, a autora ajuizou a presente ação em 07/06/2017, de sorte que está prescrita a pretensão de restituição das contribuições sociais e ao PIS/COFINS recolhidas antes de 07/06/2012.

15. Aplicação da taxa SELIC como índice de atualização monetária, sem cumulação com qualquer outro índice.

16. Conforme a orientação firmada pelo E. STJ no Tema 345, a compensação deve observar a legislação vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte.

17. Conclui-se que a apelação merece ser desprovida,  majorando em 1% (um por cento) os honorários advocatícios anteriormente fixados na sentença, nos termos do art. 85, §11 do CPC.

18. Apelação que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4a. Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à Apelação da UNIÃO, majorando em 1% os honorários advocatícios anteriormente fixados na sentença, nos termos do art. 85, § 11 do CPC, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 01 de agosto de 2023.



Documento eletrônico assinado por CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20001558453v5 e do código CRC 465d3ec5.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA
Data e Hora: 10/8/2023, às 16:14:55