Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0108875-67.2015.4.02.5005/ES

RELATOR: Desembargadora Federal VERA LUCIA LIMA DA SILVA

APELANTE: MINERACAO SULESTE LTDA (RÉU)

APELANTE: MINASGRAN MINERACAO EIRELI (RÉU)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

RELATÓRIO

A Desembargadora Federal VERA LÚCIA LIMA DA SILVA (Relatora): Trata-se de apelação interposta por MINASGRAN MINERAÇÃO EIRELI – EPP e MINERAÇÃO SULESTE LTDA em face de sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos para “condenar, de forma solidária, os réus a: a) Ressarcir ao INSS integralmente os valores pagos à dependente do segurado CRISTIANO RIBEIRO SABARA em razão do pagamento do benefício de Pensão por morte NB 21/1582602660 de uma só vez, desde o primeiro pagamento pelo INSS até a data da liquidação da sentença; b) Ressarcir ao INSS integralmente os valores do benefício que for pago, mensalmente, durante o tempo em que perdurar (após a liquidação da sentença), sendo inaplicável o artigo 533 do Novo Código de Processo Civil por não se tratar de obrigação de caráter alimentar”, tendo sido determinado, ainda, que, “Comprovado o pagamento do benefício pela Autarquia, deverá a requerida providenciar, imediatamente, o ressarcimento do valor mediante GPS – Guia da Previdência Social, na forma requerida na inicial. Ficam incluídas nas despesas de ressarcimento todas aquelas decorrentes do benefício em questão”. Ademais, os réus foram condenados, pro rata, ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% do valor atualizado da causa (JFES, evento 53).

 

Em razões recursais, a parte apelante sustenta, em suma, que “O representante da empresa ARMANI & OLIVEIRA LTDA-ME (CASA ELETRICA ARMANI) foi quem solicitou que a empresa contratante disponibilizasse mão do obra de um eletricista e um ‘Muck’ para dar suporte ao serviço contratado, sendo certo de que a responsabilidade da administração do serviço a ser prestado era exclusivamente da Empresa ARMANI & OLIVEIRA LTDA-ME (CASA ELETRICA ARMANI), via de consequência, a responsabilidade do evento danoso também e da Empresa ARMANI & OLIVEIRA LTDA-ME CASA ELETRICA ARMANI)”, destacando que “A responsabilidade pelo serviço era da Empresa que fora contratada para realizar a tarefa”, e que “todos as movimentos foram praticados pelo de cujus, sob a orientação do Sr. Valézio Armani da empresa ARMANI & OUVEIRA LTDA-ME (CASA ELETRICA ARMANI)”. Alega, ainda, “culpa única e exclusiva do DE CUJUS, eis que permaneceu em área de risco apesar de sido alertado pelo responsável pelo serviço, dando causa a fatalidade”, o que elide o dever de indenizar, a teor do que dispõe o art. 186 do Código Civil. De outro lado, afirma que “outro fator que também contribui para a reforma da decisão refere-se ao Fator Acidentário de Prevenção (FAP)”, considerando que, “se o próprio índice do FAP é calculado com base no custo dos afastamentos da Previdência Social, torna-se evidente que a propositura de eventual regressiva estaria exigindo o reembolso de suas despesas em duplicidade, fato que acarretaria excessiva onerosidade ao empregador, pois o INSS estaria buscando judicialmente o reembolso de gastos com benefícios concedidos que já estariam sendo custeados, diga-se, com superávit e de forma individualizada, com o SAT multiplicado pelo FAP”. Salienta, por fim, que “há verdadeiro bis in idem na exigência do INSS em reembolsar valores que já estão sendo calculados e exigidos dos empregadores, não tendo o menor embasamento fático ou jurídico (especialmente constitucional) a tese comumente defendida pelo INSS, no sentido de que o SAT cobriria apenas um risco ordinário de acidentes, estando os casos objeto de ação de regresso em uma situação extraordinária, fictícia e não prevista em nosso ordenamento jurídico” (JFES, evento 58).

Contrarrazões ofertadas pelo INSS, no evento 63 da JFES.

 

O Ministério Público Federal manifestou-se pela não intervenção no feito (TRF2, evento 5).

 

É o relatório.

VOTO

A Desembargadora Federal VERA LÚCIA LIMA DA SILVA (Relatora): Conforme relatado, trata-se de apelacao de GRAN MINERAÇÃO EIRELI – EPP e MINERAÇÃO SULESTE LTDA em face de sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos para “condenar, de forma solidária, os réus a: a) Ressarcir ao INSS integralmente os valores pagos à dependente do segurado CRISTIANO RIBEIRO SABARA em razão do pagamento do benefício de Pensão por morte NB 21/1582602660 de uma só vez, desde o primeiro pagamento pelo INSS até a data da liquidação da sentença; b) Ressarcir ao INSS integralmente os valores do benefício que for pago, mensalmente, durante o tempo em que perdurar (após a liquidação da sentença), sendo inaplicável o artigo 533 do Novo Código de Processo Civil por não se tratar de obrigação de caráter alimentar”, tendo sido determinado, ainda, que, “Comprovado o pagamento do benefício pela Autarquia, deverá a requerida providenciar, imediatamente, o ressarcimento do valor mediante GPS – Guia da Previdência Social, na forma requerida na inicial. Ficam incluídas nas despesas de ressarcimento todas aquelas decorrentes do benefício em questão”.

 

Conheço do recurso interposto, uma vez que se encontram presentes os pressupostos legais de admissibilidade previstos nos artigos 996, 1003, §5º, 1007 e 1010, do CPC/2015.

 

A pretensão funda-se no 120 da Lei 8.213/1991, que assim dispunha à época dos fatos: 

Art. 120.Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.

 

Por seu turno, a CLT dispõe sobre o dever das empresas de assegurar o cumprimento das normas atinentes à segurança no trabalho, in verbis:

Art. 157. Cabe às empresas:

I - cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho;

II - instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais.

        

E o art. 19 da Lei 8.213/91 define o que é acidente de trabalho e dispõe sobre os deveres e responsabilidades das empresas:

Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

§1º A empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador.

§2º Constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho.

§3º É dever da empresa prestar informações pormenorizadas sobre os riscos da operação a executar e do produto a manipular.

 

Tais dispositivos de lei dão efetividade ao art. 7º, XXII, da Constituição Federal, que se insere no âmbito dos direitos sociais e fundamentais:

Art. 7º CF. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

 XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.  

 

Destarte, cabe perquirir se, no caso concreto, houve negligência das empresas rés no cumprimento das normas atinentes à segurança no trabalho, bem como no dever de instruir seus funcionários sobre os riscos inerentes ao cumprimento da empreitada.

 

Compulsando os autos, consta no Laudo Técnico de Análise de Acidente de Trabalho (JFES, evento 1, outros 6), elaborado por Auditor Fiscal, que, “Na ocasião do acidente, a vítima, o Sr. Cristiano, o Sr. Antônio Dias Guimarães, empregado da Mineração Suleste e operador do caminhão munck e o Sr. Valésio Armani, responsável pela empresa Armani & Oliveira Ltda contratada para a tarefa, estavam participando conjuntamente da troca de um transformador elétrico. Durante a instalação do novo transportador, o Sr. Armani percebeu que o mesmo possuía quatro fendas de encaixe e os suportes inferior e superior que se encontravam no poste eram adequados para apenas uma fenda em cada um, de posicionamento central, e não nas laterais como deveria ser para o perfeito encaixe do transformador. Diante da situação, o Sr. Cristiano pediu para o motorista do Munck que descesse o equipamento e o levasse até a oficina da empresa (a 200 metros do local do acidente). Lá a vítima abriu uma fenda central em cada suporte, inferior e superior, do novo transformador, com a ajuda de um maçarico. Observaram que as fendas eram menores que as larguras dos parafusos de encaixe do poste. Retornaram o transformador à oficina e foi aumentado o diâmetro das fendas. Na terceira tentativa conseguiram encaixar o transformador, porém de forma inadequada, uma vez que os cabos de aço ao içar o equipamento estavam apenas dobrados sob os ganchos de transformador, e tal fato associado ao improviso das aberturas de novas fendas provocou instabilidade e movimentos pendulares do equipamento, que ocasionaram o desprendimento do cabo de aço do gancho do transformador e este veio a cair em cima da laje que cobria o painel elétrico, onde o Sr. Cristiano estava laborando. Em decorrência disso, o trabalhador foi atingido e veio a óbito”.

 

Na ocasião, o Auditor Fiscal do Trabalho atestou que os seguintes fatores contribuíram para a ocorrência do acidente:

“(...) Imediatos – Alterações indevidas nas estruturas do equipamento, quando do improviso; cabos de aço utilizados de forma incorreta nos ganchos do transformador, ao realizar a operação de içamento; ausência de sinalização de segurança e falta de isolamento da área de operação da troca do transformador.

Subjacentes: Ausência de procedimento operacional padronizado escrito para a tarefa; ausência de análise de riscos da atividade (queda de equipamento, choque elétrico etc); não emissão de ordem de serviço específica quando da realização de serviço que envolva risco de acidente de trabalho; falta de gestão de segurança e saúde no trabalho, especialmente no tocante à inexistência de SESMT constituído. Pressão para conclusão de atividade que se iniciara às 12:30h e por volta das 16:40h ainda não havia sido finalizada.

Latentes: Deficiência na gestão de SST da empresa quanto a não implementação de medidas de proteção e controle que visem a garantir a preservação da saúde e da integridade física de seus empregados.

(...)"

 

Salientou, ainda, que, após o acidente, não foi identificada a adoção de segurança adotadas pelas empresas acima autuadas, em relação à atividade de troca de transformador, tendo observado, in fine, que “a deficiência no planejamento e na gestão de SST contribuiu para o ocorrido, especialmente no tocante à ausência de procedimentos escritos para a atividade acima descrita”. Aduziu, outrossim, que “A permissividade da empresa quanto à exposição de seus trabalhadores a situações que oferecem riscos de acidentes foi fator preponderante para a geração do acidente fatal, que poderia ter sido evitado caso a empresa tivesse adotado medidas preventivas e de controle de riscos supramencionados”.

 

Consta, ainda, auto de infração lavrado durante ação fiscal mista, no endereço onde funciona a EMPRESA MINERAÇÃO DULESTE LTDA, com o propósito de analisar o acidente fatal ocorrido ali, que teve como vítima o empregado da autuada. Foi apurado que a relação mantida entre o empregador do acidentado e a empresa onde houve o acidente é de grupo econômico, formado por mais quatro empresas, e que a atividade predominante no grupo é a extração de granitos, classificada como grau de risco 4, constante na Classificação Nacional de Atividades Econômicas -CNAE, ou seja, o maior grau de risco possível, o que resulta no maior número de obrigações legais relacionadas à saúde e segurança do trabalho. Como o número de empregados do grupo econômico em questão totalizava 240, foi verificada a necessidade de serviço especializado em engenharia de segurança e em medicina do trabalho, ao passo que o grupo era, então, composto de um único técnico de segurança do trabalho, registrado na empresa Icaraí Granitos e Mármores Ltda. (JFES, evento 1, outros 8). Convém ressaltar que nos meses que se seguiram, a empresa em epígrafe foi reiteradamente autuada, ante a ausência de profissional especializado em engenharia de segurança e em medicina do trabalho, dentre outras infrações.

 

Cabe destacar que, de acordo com a sentença proferida no bojo da ação que tramitou perante a Justiça do Trabalho, “O que em verdade ocorreu foi um erro de execução por parte do operador do Munck, empregado da 2ª Ré, que tem responsabilidade pelo fato de seu empregado (art. 932, III, do CCB), que foi a causa primária do acidente, e não a fixação dos cabos de aço no transformador. Ao puxar o transformador para cima, ao invés de aprumá-lo na posição correta para a fixação dos parafusos, o operador causou a perda da base de sustentação da peça, que se desprendeu assim de suas amarras, caindo sobre o local em que se encontrava a vítima, que decerto não teria sofrido tal revés se estivesse em local seguro, distante da área de risco (...)” (JFES, evento 1, outros 10).

 

Da leitura dos documentos que acompanham a inicial, destacando-se os aspectos acima mencionados, extrai-se que, para eximir-se da responsabilidade com base em culpa exclusiva de terceiro, deve a empresa comprovar que efetivamente cumpriu com os requisitos necessários à segurança dos trabalhadores na situação relatada nos autos, o que, no caso, não ocorreu, considerando que o evento morte se deu porque o acidentado se encontrava em local indevido - conforme devidamente reconhecido na decisão proferida pela Justiça do Trabalho, porquanto, tanto a empregadora (MINASGRAN), quanto a empresa contratante,  pertencentes ao mesmo grupo econômico, como visto alhures, descumpriram as normas de segurança do trabalho (negligência), pois cabia a ambas (contratante e contratada), “interromper todo e qualquer tipo de atividade ou garantir aos empregadores interromperem, imediatamente, suas atividades, em caso de ocorrência de riscos ambientais tais que os coloquem em situação de grave e eminente risco” – responsabilidade do empregador expressa no item 17.1 do Programa de Gerenciamento de Risco das rés, acostado no evento 44 da JFES, o que, à evidência, foi inobservado.

 

Com efeito, não há nos autos documento hábil a demonstrar o acompanhamento de profissional de segurança habilitado, tampouco a realização de sinalização e isolamento da área, de modo que a dinâmica dos fatos aponta para a culpa das empresas e enseja, como sustenta a autarquia previdenciária, a responsabilização das recorrentes.

 

Por derradeiro, a alegação de cobrança em duplicidade configura indevida inovação recursal, razão pela qual se afigura defeso ao Juízo a quo conhecer de tal matéria. 

 

Posto isso, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação, com a majoração da verba honorária anteriormente fixada em 1%, na forma do disposto no art. 85, § 11, do CPC/2015.



Documento eletrônico assinado por VERA LUCIA LIMA DA SILVA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20000857657v13 e do código CRC 99a63556.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VERA LUCIA LIMA DA SILVA
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Processo n. 0108875-67.2015.4.02.5005
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0108875-67.2015.4.02.5005/ES

RELATOR: Desembargadora Federal VERA LUCIA LIMA DA SILVA

APELANTE: MINERACAO SULESTE LTDA (RÉU)

APELANTE: MINASGRAN MINERACAO EIRELI (RÉU)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA ACIDENTÁRIA. RESPONSABILIDADE DAS EMPRESAS RÉS PELO ACIDENTE DE TRABALHO. COMPROVAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA.  

- Cuida-se de apelação interposta por MINASGRAN MINERAÇÃO EIRELI – EPP e MINERAÇÃO SULESTE LTDA em face de sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos para “condenar, de forma solidária, os réus a: a) Ressarcir ao INSS integralmente os valores pagos à dependente do segurado CRISTIANO RIBEIRO SABARA em razão do pagamento do benefício de Pensão por morte NB 21/1582602660 de uma só vez, desde o primeiro pagamento pelo INSS até a data da liquidação da sentença; b) Ressarcir ao INSS integralmente os valores do benefício que for pago, mensalmente, durante o tempo em que perdurar (após a liquidação da sentença), sendo inaplicável o artigo 533 do Novo Código de Processo Civil por não se tratar de obrigação de caráter alimentar”, tendo sido determinado, ainda, que, “Comprovado o pagamento do benefício pela Autarquia, deverá a requerida providenciar, imediatamente, o ressarcimento do valor mediante GPS – Guia da Previdência Social, na forma requerida na inicial. Ficam incluídas nas despesas de ressarcimento todas aquelas decorrentes do benefício em questão”.

- Cabe perquirir se, no caso concreto, houve negligência das empresas rés no cumprimento das normas atinentes à segurança no trabalho, bem como no dever de instruir seus funcionários sobre os riscos inerentes ao cumprimento da empreitada.

- Compulsando os autos, consta no Laudo Técnico de Análise de Acidente de Trabalho (JFES, evento 1, outros 6), elaborado por Auditor Fiscal, que, “Na ocasião do acidente, a vítima, o Sr. Cristiano, o Sr. Antônio Dias Guimarães, empregado da Mineração Suleste e operador do caminhão munck e o Sr. Valésio Armani, responsável pela empresa Armani & Oliveira Ltda contratada para a tarefa, estavam participando conjuntamente da troca de um transformador elétrico. Durante a instalação do novo transportador, o Sr. Armani percebeu que o mesmo possuía quatro fendas de encaixe e os suportes inferior e superior que se encontravam no poste eram adequados para apenas uma fenda em cada um, de posicionamento central, e não nas laterais como deveria ser para o perfeito encaixe do transformador. Diante da situação, o Sr. Cristiano pediu para o motorista do Munck que descesse o equipamento e o levasse até a oficina da empresa (a 200 metros do local do acidente). Lá a vítima abriu uma fenda central em cada suporte, inferior e superior, do novo transformador, com a ajuda de um maçarico. Observaram que as fendas eram menores que as larguras dos parafusos de encaixe do poste. Retornaram o transformador à oficina e foi aumentado o diâmetro das fendas. Na terceira tentativa conseguiram encaixar o transformador, porém de forma inadequada, uma vez que os cabos de aço ao içar o equipamento estavam apenas dobrados sob os ganchos de transformador, e tal fato associado ao improviso das aberturas de novas fendas provocou instabilidade e movimentos pendulares do equipamento, que ocasionaram o desprendimento do cabo de aço do gancho do transformador e este veio a cair em cima da laje que cobria o painel elétrico, onde o Sr. Cristiano estava laborando. Em decorrência disso, o trabalhador foi atingido e veio a óbito”.

- Na ocasião, o Auditor Fiscal do Trabalho atestou que os seguintes fatores contribuíram para a ocorrência do acidente: “(...) Imediatos – Alterações indevidas nas estruturas do equipamento, quando do improviso; cabos de aço utilizados de forma incorreta nos ganchos do transformador, ao realizar a operação de içamento; ausência de sinalização de segurança e falta de isolamento da área de operação da troca do transformador. Subjacentes: Ausência de procedimento operacional padronizado escrito para a tarefa; ausência de análise de riscos da atividade (queda de equipamento, choque elétrico etc); não emissão de ordem de serviço específica quando da realização de serviço que envolva risco de acidente de trabalho; falta de gestão de segurança e saúde no trabalho, especialmente no tocante à inexistência de SESMT constituído. Pressão para conclusão de atividade que se iniciara às 12:30h e por volta das 16:40h ainda não havia sido finalizada. Latentes: Deficiência na gestão de SST da empresa quanto a não implementação de medidas de proteção e controle que visem a garantir a preservação da saúde e da integridade física de seus empregados (...)”. Salientou, ainda, que, após o acidente, não foi identificada a adoção de medidas de segurança por parte das empresas e epígrafe, em relação à atividade de troca de transformador, tendo observado, in fine, que “a deficiência no planejamento e na gestão de SST contribuiu para o ocorrido, especialmente no tocante à ausência de procedimentos escritos para a atividade acima descrita”. Aduziu, outrossim, que “A permissividade da empresa quanto à exposição de seus trabalhadores a situações que oferecem riscos de acidentes foi fator preponderante para a geração do acidente fatal, que poderia ter sido evitado caso a empresa tivesse adotado medidas preventivas e de controle de riscos supramencionados”. Consta, ainda, auto de infração lavrado durante ação fiscal mista, no endereço onde funciona a EMPRESA MINERAÇÃO DULESTE LTDA, com o propósito de analisar o acidente fatal ocorrido ali, que teve como vítima o empregado da autuada. Foi apurado que a relação mantida entre o empregador do acidentado e a empresa onde houve o acidente é de grupo econômico, formado por mais quatro empresas, e que a atividade predominante no grupo é a extração de granitos, classificada como grau de risco 4, constante na Classificação Nacional de Atividades Econômicas -CNAE, ou seja, o maior grau de risco possível, o que resulta no maior número de obrigações legais relacionadas à saúde e segurança do trabalho. Como o número de empregados do grupo econômico em questão totalizava 240, foi verificada a necessidade de serviço especializado em engenharia de segurança e em medicina do trabalho, ao passo que o grupo era, então, composto de um único técnico de segurança do trabalho, registrado na empresa Icaraí Granitos e Mármores Ltda. (JFES, evento 1, outros 8). Convém ressaltar que nos meses que se seguiram, a empresa em epígrafe foi reiteradamente autuada, ante a ausência de profissional especializado em engenharia de segurança e em medicina do trabalho, dentre outras infrações.

- Da leitura dos documentos que acompanham a inicial, destacando-se os aspectos acima mencionados, extrai-se que, para eximir-se da responsabilidade com base em culpa exclusiva de terceiro, deve a empresa comprovar que, efetivamente, cumpriu com os requisitos necessários à segurança dos trabalhadores na situação relatada nos autos, o que, no caso, não ocorreu, considerando que o evento morte se deu porque o acidentado se encontrava em local indevido - conforme devidamente reconhecido na decisão proferida pela Justiça do Trabalho, porquant,o tanto a empregadora (MINASGRAN), quanto a empresa contratante, e pertencente ao mesmo grupo econômico, como visto alhures, descumpriram as normas de segurança do trabalho (negligência), pois cabia a ambas (contratante e contratada), “interromper todo e qualquer tipo de atividade ou garantir aos empregadores interromperem, imediatamente, suas atividades, em caso de ocorrência de riscos ambientais tais que os coloquem em situação de grave e eminente risco” – responsabilidade do empregador expressa no item 17.1, do Programa de Gerenciamento de Risco das rés, acostado no evento 44 da JFES, o que, à evidência, foi inobservado. Com efeito, não há nos autos documento hábil a demonstrar o acompanhamento de profissional de segurança habilitado, tampouco a realização de sinalização e isolamento da área, de modo que a dinâmica dos fatos aponta para a culpa das empresas e enseja, como sustenta a autarquia previdenciária, a responsabilização das recorrentes.

- A alegação de cobrança em duplicidade configura indevida inovação recursal, razão pela qual se afigura defeso ao Juízo a quo conhecer de tal matéria. 

- Recurso das rés desprovido, com a majoração da verba honorária anteriormente fixada em 1%, na forma do disposto no art. 85, § 11, do CPC/2015.

 

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 8a. Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação, com a majoração da verba honorária anteriormente fixada em 1%, na forma do disposto no art. 85, § 11, do CPC/2015, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 29 de março de 2022.



Documento eletrônico assinado por VERA LUCIA LIMA DA SILVA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20000857658v8 e do código CRC 26ad0c6f.

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Data e Hora: 8/4/2022, às 13:8:9