Apelação Cível Nº 0001703-85.2007.4.02.5154/RJ
RELATOR: Desembargador Federal ALCIDES MARTINS
APELANTE: FATIMA LOURDES DA SILVA NOBREGA
APELANTE: JOSE ROBERTO DA SILVA NOBREGA
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta por JOSÉ ROBERTO DA SILVA NÓBREGA e FÁTIMA LOURDES DA SILVA NÓBREGA em face da sentença (evento 94, out 10, 2º grau) que, proferida nos autos da ação ordinária movida pelos ora apelantes contra a CAIXA ECÔNOMICA FEDERAL, julgou improcedentes os pedidos de indenização pelas parcelas pagas, repetição do indébito em dobro e indenização por danos morais, nos termos do art. 487, I, do CPC.
Em suas razões recursais (evento 97, out 13, 2º grau), os apelantes alegam que, com o provimento de seu recurso especial em que o Superior Tribunal de Justiça reconheceu o pedido de exoneração da fiança, é cabível a restituição em dobro das prestações pagas após o óbito de sua filha/beneficiária do FIES, assim como deve ser reconhecida a ilicitude da negativação indevida de seus nomes nos cadastros restritivos de crédito. Afirmam que a CEF negativou seus nomes sem prévia comunicação/notificação, o que viola o disposto no art. 43, §2º, do CDC. Defendem que têm direito ao pagamento de indenização por danos morais pela indevida inscrição de seus nomes nos órgãos de restrição ao crédito, o que lhes gerou constrangimento.
A CEF, ora apelada, deixou transcorrer o prazo sem que ofertasse contrarrazões (evento 99, 1º grau).
O Ministério Público Federal não emitiu parecer (evento 109, out20, 2º grau).
VOTO
A sentença merece ser anulada por ausência de fundamentação.
Na origem, os autores ajuizaram a presente ação objetivando a desconstituição da fiança prestada em contrato de FIES em decorrência do falecimento da estudante beneficiária (filha dos autores), a condenação da CEF à devolução das prestações pagas após o óbito da afiançada e ao pagamento por danos morais diante da indevida negativação de seus nomes nos cadastros restritivos de crédito (evento 86, out2, 1º grau).
Inicialmente, foi proferida sentença de improcedência (evento 89, out5, 2º grau), tendo esta 5ª Turma Especializada mantido a decisão (evento 91, out7, fls. 7/12 e fls. 24/29, 2º grau).
Interposto Recurso Especial pelos autores (evento 91, fls. 32/35, e evento 92, fls. 1/8, 2º grau), o Superior Tribunal de Justiça deu parcial provimento ao recurso, “a fim de reconhecer a exoneração dos fiadores da obrigação assumida por sua filha. Havendo, contudo, causa de pedir remanescente, pendente de apreciação, determino o retorno dos autos ao Juízo de 1ª instância, para que prossiga no julgamento da demanda, como entender de direito” (evento 93, out9, fls. 21/25).
Retornados os autos à primeira instância, as partes foram intimadas (evento 93, fl. 33), oportunidade em que os autores solicitaram o julgamento do pedido inicial remanescente (evento 93, out9, fls. 37/40, 2º grau).
Ato contínuo, o juízo a quo proferiu a sentença ora recorrida nos seguintes termos (evento 94, out10, 2º grau):
(...) Inicialmente, destaque-se que o processo retornou a este Juízo para julgamento de causa de pedir não decidida. Portanto, não se cuida de novo julgamento ou de adequação a entendimentos da instância superior.
A rigor, tendo-se em conta que a sentença anteriormente proferida julgou improcedente a desconstituição da fiança, os pedidos acessórios restaram abarcados pela improcedência.
A decisão do Tribunal Superior não apontou especificamente a causa de pedir não apreciada pela sentença de fls. 105/107. Da petição inicial extrai-se que os autores pedem: i) indenização pelas parcelas pagas; ii) repetição do indébito em dobro; e iii) indenização por danos morais.
Há, ainda, listada no tópico dos pedidos, em fl. 11, uma menção genérica à inversão do ônus da prova, que desmerece maiores embates, tendo em vista que não indica qual prova deve ser facilitada. Ademais, afasta-se a incidência do CDC para os contratos de financiamento estudantil (REsp 1.155.684).
Desse modo, coerente ao julgado pela sentença de fls. 105/107, não prosperam os demais pedidos.
III – DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos de indenização pelas parcelas pagas, repetição do indébito em dobro e indenização por danos morais, nos termos do art. 487, I, do CPC. (...)”
Diante das inúmeras ações submetidas ao magistrado, as decisões judiciais podem ser sucintas desde que enfrentem o essencial, o que não ocorreu no caso.
Da leitura do julgado ora recorrido, é de se ver que o juízo a quo desacolheu o pleito autoral de forma genérica, basicamente consignando no dispositivo a improcedência dos “pedidos de indenização pelas parcelas pagas, repetição do indébito em dobro e indenização por danos morais”, sem revelar por quais motivos chegou a essa conclusão. Não indicou as razões da formação do seu convencimento. Ora, ao ser reconhecida, pelo STJ, a exoneração dos fiadores da obrigação assumida por sua filha, resta clara a necessidade de se decidir sobre os demais pedidos recursais (devolução das prestações pagas após o óbito da afiançada e pagamento de indenização por danos morais), cuja análise só fora prejudicada por entender o julgamento reformado pela inexistência da exoneração da fiança (evento 91, out7, fls. 7/12, 2º grau).
Como é sabido, a decisão que viola o princípio da fundamentação deve ser anulada (art. 93, IX, da CR/88 c/c art. 489, §1º, do CPC).
Nesse sentido, confiram-se os seguintes arestos desta Corte:
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO FUNDAMENTADA. NULIDADE. ARTIGOS 489, §1º, IV E 1.013, IV DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 1. Entendeu o julgador a quo que houve modificação da causa de pedir, tendo em vista que a parte autora na petição inicial afirmava que havia declarado corretamente os seus créditos para fins de compensação, enquanto que na réplica admitiu que houveram erros no preenchimento manual da PER/DCOMP. Aduziu que "não houve pedido de modificação da causa de pedir para fins do art. 264 do CPC. Logo, não é possível conhecer dessas alegações. Conclui-se portanto, que os atos administrativamente impugnados foram praticados corretamente." (fls. 622). 2. A causa de pedir para que se reconheça a nulidade dos lançamentos fiscais é que os créditos fiscais "foram devidamente quitados por meio de declarações de compensação" (fl. 03). 3. Constata-se que, embora tenha sido deferida a prova pericial, não houve qualquer análise da prova produzida, tendo o juízo a quo se limitado a afirmar que os atos administrativos foram praticados corretamente por conta de uma inexistente inovação na causa de pedir. Não houve qualquer análise sobre a existência, ou não, dos créditos tributários discutidos. 4. De acordo com o artigo 1.013, IV, CPC, a sentença é nula por falta de fundamentação. De outra parte, o artigo 489, § 1º, IV do CPC, esclarece que não se considera fundamentada a sentença que não enfrenta todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador. 5. Sentença anulada de ofício. Apelação prejudicada
(AC 0010316-20.2011.4.02.5101, Relator Des. Fed. MARCUS ABRAHAM, 3ª TURMA ESPECIALIZADA, julgado em 24/04/2019, g.n.)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECEBIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. DECISÃO QUE CARECE DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE. 1. A decisão que recebe a petição inicial da ação de improbidade administrativa (§8o do art. 17 da Lei 8.429/92) deve ser fundamentada. 2. As decisões judiciais podem ser concisas, até mesmo diante da multiplicidade de demandas submetidas a um magistrado, desde que enfrentem o essencial, o que não ocorreu no caso concreto. É papel do juiz apresentar fundamentação, ainda que sucinta, sobre a regularidade da petição inicial e presença de justa causa, consistentes em fundados indícios da prática de atos de improbidade, bem como sobre as alegações do réu constantes da defesa preliminar, em sintonia com o comando constitucional do inc. IX do art. 93 da Constituição Federal. 3. A decisão agravada deixou de declinar os motivos pelos quais as questões levantadas pelos réus, ora agravantes, no contraditório preliminar não seriam suficientes para afastar os índicos de materialidade e autoria da ação de improbidade administrativa, notadamente diante da alegação de ausência de individualização das condutas dos agravantes, ressaltando que "somente restou identificada as condutas dos servidores da Receita Federal, e não das empresas, não havendo uma linha sequer onde restou descrita os atos dos representantes legais das empresas" e que "não há nos autos qualquer prova" de que o agravante, representante legal da pessoa jurídica, "tenha induzido ou concorrido para o suposto ato ímprobo". 4. A menção genérica no sentido de que os "documentos anexados pelo MPF à inicial consubstanciam lastro probatório mínimo dos fatos declinados na causa de pedir da demanda", sem especificá-los e sem demonstrar o seu vínculo com os réus, não se mostra suficiente para embasar o juízo de recebimento da petição inicial de improbidade administrativa em relação aos ora recorrentes. 5. A decisão é nula por falta de fundamentação com relação aos agravantes. 6. Agravo de instrumento conhecido e provido.
(AC 0004755-45.2018.4.02.0000, Relator Des. Fed. José Antônio Neiva, 7ª Turma Especializada, julgado em 30/11/2018)
Ante o exposto, voto no sentido de declarar, de ofício, a nulidade da sentença. Determino, em consequência, a remessa dos autos ao juízo de origem para que outra seja prolatada com a devida análise dos pedidos remanescentes, restando prejudicado o recurso de apelação.