Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0001575-27.2007.4.02.5102/RJ

RELATOR: Desembargador Federal MARCELLO FERREIRA DE SOUZA GRANADO

APELANTE: BIK BOK CONFECCOES EIRELI

APELANTE: B.B.K. CONFECCOES EIRELI

APELADO: UNIAO DE LOJAS LEADER S.A

APELADO: Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI

RELATÓRIO

Cuida-se de retorno do STJ. 

O acórdão impugnado negou provimento à apelação para manter integralmente a sentença de primeiro grau, que julgou improcedente o pedido autoral  de nulidade dos registros nºs 821.964.437 e 823.009.769, relativos à marca mista “BIK BOK” para as classes 25:10- calçados (inclusive botas e perneiras), couros, peles e derivados (malas, bolsas, pastas), guarda-chuvas, bengalas e guarda-sóis, roupas brancas para homens e crianças, roupas feitas para homens e crianças, materiais esportivos, vestuário, roupas brancas para senhoras (lingerie). calçados (inclusive botas e perneiras), couros, peles e derivados (malas, bolsas, pastas), guarda-chuvas, bengalas e guarda-sóis, roupas brancas para homens e crianças, roupas feitas para homens e crianças, materiais esportivos, vestuário, roupas brancas para senhoras (lingerie). calçados (inclusive botas e perneiras), couros, peles e derivados (malas, bolsas, pastas), guarda-chuvas, bengalas e guarda-sóis, roupas brancas para homens e crianças, roupas feitas para homens e crianças, materiais esportivos, vestuário, roupas brancas para senhoras (lingerie)  NCL (7)18- saco de acampamento; peles de animais; bandoleiras [correias usadas a tiracolo]; baús [malas]; bengalas; bolsas; armação para bolsas; bolsas de caça; bolsas de senhora [bolsas de mão]; bolsas de viagem; bolsas em malhas, exceto de metal precioso; peles de camurça, exceto para limpeza; capas de couro para móveis; capas de guarda-chuva; carteiras de dinheiro; carteiras, exceto de metal precioso; chaveiro [objetos de couro]; coleiras para animais; coleiras para cães; cordões de couro; correias de couro; correias de couro usadas a tiracolo [bandoleiras]; correias para patins; enfeites para móveis em couro; sacolas de couro para embalagem [bolsas]; estojo de cosméticos [nécessaire]; estojo de viagem [artigos de couro]; estojos em couro ou em cartão-couro; peles de gado; guarda-chuvas; guarda-sol [barracas de praia]; malas de roupas para viagem; malas de viagem; maletas para documentos; mochilas; mochilas (bornais); mochilas escolares; porta-música; pastas para papéis; pastas para estudantes; pele de cabrito; porta-cartas; sacos de praia; sacos de rede para compras; sacolas de compras; sacolas de couro [bolsas] para viagem; sacolas escolares; sacos de alpinistas; sacos de couro para ferramentas; sacos para transportar bebês; valises, respectivamente, por entender, que (i) o direito de precedência decorrente do pré-uso tem lugar, para invocação, no procedimento administrativo no qual se objetiva a marca utilizada, fato que não ocorreu, pelo que configurada a preclusão; (ii) já no que toca à proteção ao nome empresarial, entendeu que foi ela relativizada pela nova Lei da Propriedade Industrial, concluindo que "além de a empresa BIK BOK CONFECÇÕES LTDA. nunca ter se utilizado efetivamente da expressão 'BIK BOK'- como marca, esta foi constituída posteriormente à empresa norueguesa Bi Bo A/S, atuante no ramo de confecções, titular de registros em diversos países. Em outras palavras, muito antes das apelantes iniciarem as suas atividades empresariais, a empresa norueguesa Bi Bo A/S já utilizava a expressão 'BIK BOK' à titulo de marca, para designar roupas e acessórios".

Nas razões do  recurso especial da B.B.K. CONFECÇÕES EIRELI e outro,  alegaram a violação dos arts. 124, V, e 129, § 1º, da Lei n. 9.279/96. 

O Recurso Especial restou provido  para determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que se pronuncie acerca de matéria fática imprescindível para a solução da presente demanda, na esteira dos precedentes daquela Corte Superior e em atenção ao devido processo legal, in verbis: (i) "Com efeito, o Tribunal de origem, ao afirmar que, 'com a conclusão do procedimento administrativo e a concessão do registro, sem que tenha havido qualquer oposição por parte do detentor do direito de precedência, não cabe invocá-lo para anular judicialmente o registro de outrem, ante a ocorrência de preclusão' (e-STJ, fl. 693), contrariou o entendimento desta Corte Superior.  Isso porque é pacífico no âmbito do STJ que, ultrapassado o procedimento administrativo para registro de marca perante o INPI, é possível ao titular de nome empresarial ou título de estabelecimento pleitear judicialmente a nulidade do registro concedido mediante violação do art. 124 da Lei n. 9.279/1996"; (ii) "Contudo, como bem se denota do segundo acórdão transcrito, o confronto entre marcas e nomes empresariais no Brasil deve ter em consideração as peculiaridades da proteção legal assegurada a cada um dos institutos, os quais, na legislação atual, guardam um descompasso quanto à amplitude territorial de proteção. Nesse contexto, o nome empresarial somente pode inviabilizar o registro de marca se seu titular houver adotado as providências necessárias para extensão de sua proteção em âmbito nacional, o que é assegurado por meio de pedido complementar de arquivamento nas demais Juntas Comerciais (REsp n. 1.359.666/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 10/6/2013)"; (iii) "Nessa ordem de ideias, é imprescindível à solução da presente lide que se apure a extensão da proteção conferida ao nome empresarial e sub judice, a fim de se aferir a nulidade, ou não, do registro da marca impugnada".

É o relatório.

Peço dia. 

 


 

Processo n. 0001575-27.2007.4.02.5102
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0001575-27.2007.4.02.5102/RJ

RELATOR: Desembargador Federal MARCELLO FERREIRA DE SOUZA GRANADO

APELANTE: BIK BOK CONFECCOES EIRELI

APELANTE: B.B.K. CONFECCOES EIRELI

APELADO: INPI-INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

APELADO: UNIAO DE LOJAS LEADER S.A

VOTO-VISTA

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL FLÁVIO LUCAS:

Na Sessão do dia 24/5/2022 pedi vistas dos presentes autos para o fim de analisar a questão da abrangência da proteção do nome comercial.

Com efeito, sobre o tema acompanho o Exmo. Relator para entender que, em razão do princípio da territorialidade, a tutela do nome empresarial circunscreve-se à unidade federativa de competência da Junta Comercial em que inscritos os atos constitutivos da empresa, podendo ser estendida a todo o território nacional caso seja feito pedido complementar de arquivamento nas demais juntas do país (artigo 1.166 do Código Civil).

Assim, adoto os fundamentos do voto do Exmo. Relator no sentido de que: “o direito ao uso exclusivo de um nome comercial, à luz da legislação vigente, circunscreve-se somente ao estado da federação que possua o registro em sua Junta Comercial (art. 61, § 1º, do Decreto n. 1.800/96 que regulamenta a Lei n. 8.934/94), podendo o referido direito ser estendido a outros Estados, desde que seja observado o procedimento especial, conforme os artigos 61, § 1ª e § 2° do Decreto 1.800/96 e o artigo 1.166 do novo Código Civil.”

Esse, inclusive, é o entendimento que vem sendo adotado pelo E. STJ, consoante julgados a seguir destacados:

 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO POSTULANDO A DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO REGISTRO DA MARCA MISTA "YPÊ". PROPRIEDADE INDUSTRIAL. QUALIDADE DA INTERVENÇÃO DO INPI NO CASO CONCRETO. COLIDÊNCIA ENTRE NOME EMPRESARIAL (PRECEDENTE) E MARCA.

1. A definição da qualidade da intervenção do INPI na ação de nulidade de registro de marca perpassa pela análise da causa de pedir, sempre levando em conta que a pretensão em comento encarta, principalmente, o interesse público, impessoal, de fiscalização e regulação da propriedade industrial, com o necessário estímulo ao desenvolvimento tecnológico e econômico do país, assegurando-se a livre iniciativa, a observância da função social da propriedade e a proteção do mercado consumidor. Precedente: REsp 1.264.644/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 28.06.2016, DJe 09.08.2016. Hipótese em que a atuação processual autárquica deu-se a título de intervenção sui generis, de assistente especial (ou até como amicus curiae), inclusive por se dar de forma obrigatória e tendo a presunção absoluta de interesse na causa. Não caracterizado o litisconsórcio passivo necessário apontado pelo Tribunal de origem.

2. A atual Lei da Propriedade Industrial (Lei 9.279/96) adotou o sistema atributivo mitigado da propriedade marcária, estabelecendo a necessidade de registro como regra, mas atribuindo "direito de precedência" ao utente de boa-fé, consoante se extrai do artigo 129.

3. Consoante assente em precedentes da Terceira Turma, revela-se possível o exercício do direito de precedência mesmo após a concessão do registro da marca (ou seja, no bojo de ação judicial de nulidade), desde que observado o principio da especialidade, positivado no inciso XIX do artigo 124 da Lei 9.279/1996, que preconiza a possibilidade de coexistência de marcas semelhantes ou afins não suscetíveis de causar associação indevida ou confusão no mercado consumidor (REsp 1.673.450/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 19.09.2017, DJe 26.09.2017; e REsp 1.464.975/PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 01.12.2016, DJe 14.12.2016).

4. A tutela do nome comercial, no âmbito da propriedade industrial, assim como a marca, tem como fim maior obstar o proveito econômico parasitário, o desvio de clientela e a proteção ao consumidor.

5. Não obstante, as formas de proteção a tais institutos não se confundem. Em razão do chamado princípio da territorialidade, a tutela do nome empresarial circunscreve-se à unidade federativa de competência da junta comercial em que inscritos os atos constitutivos da empresa, podendo ser estendida a todo o território nacional caso seja feito pedido complementar de arquivamento nas demais juntas do país (artigo 1.166 do Código Civil).

6. Por sua vez, o registro da marca confere ao titular o direito de uso exclusivo do signo em todo o território nacional e, consequentemente, a prerrogativa de compelir terceiros a cessarem a utilização de sinais idênticos ou semelhantes (artigo 129, caput, da Lei 9.279/96).

7. É certo que o inciso V do artigo 124 da Lei de Propriedade Industrial preceitua a irregistrabilidade de marca que reproduza ou imite elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos.

8. Contudo, o exame da colidência entre o nome empresarial e a marca não se restringe ao direito de precedência, afigurando-se necessário levar em consideração o princípio da territorialidade supracitado (artigo 1.166 do Código Civil), além do princípio da especialidade (possibilidade de coexistência de marcas semelhantes ou afins não suscetíveis de causar associação indevida ou confusão no mercado consumidor).

9. No presente caso, como é incontroverso nos autos: (a) ambas as partes atuam no mesmo segmento de mercado - prestação de serviços de construção e engenharia -, malgrado tenham sede em regiões diferentes do Brasil (a autora em Brasília - DF e a ré em São Paulo - SP); (b) embora a constituição da autora (CONSTRUTORA IPÊ LTDA.) tenha se dado em 1961, bem antes da constituição da ré (YPÊ ENGENHARIA LTDA.), foi esta quem diligenciou no sentido de registrar o signo em questão ("YPÊ"), tendo efetuado o depósito em 11.08.1994;(c) somente nove anos depois (em 16.04.2003), a autora fez o depósito do pedido de registro da marca "CONSTRUTORA IPÊ"; e (d) a demandante não realizou o registro complementar de seus atos constitutivos nas Juntas Comerciais de todos os Estados da Federação.

10. Nesse quadro, sem olvidar o direito de precedência alegado pela autora, constata-se que o deslinde da controvérsia resolve-se à luz dos princípios da territorialidade e da especialidade, não merecendo reparo o acórdão regional que pugnou pela possibilidade de coexistência do nome da sociedade empresária (cujos atos constitutivos foram inscritos apenas em Brasília - DF) com a marca da ré, cujo registro encontra proteção em todo território nacional, não se extraindo da causa de pedir inserta na inicial (nem da sentença de procedência ou das contrarrazões da apelação) elementos demonstrativos de potencial confusão do público consumidor ou de associação indevida.

11. Recurso especial não provido.

(REsp n. 1.494.306/RJ, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 7/11/2019, DJe de 18/12/2019.)

 

 

PROCESSO CIVIL E CIVIL. AÇÕES ORDINÁRIAS. MARCA "RACIONAL". REGISTRO EXTINTO. PRAZO DE VIGÊNCIA EXPIRADO. REQUERIMENTO DE PRORROGAÇÃO. EFEITOS. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/1973 NÃO ALEGADA. NOMES COMERCIAIS "RACIONAL ENGENHARIA LTDA." E "RACIONAL INDÚSTRIA DE PRÉ-FABRICADOS LTDA.". CONFUSÃO NÃO COMPROVADA. COINCIDÊNCIA DE UM ÚNICO VOCÁBULO. PALAVRA DE USO COMUM. PROTEÇÃO NA CIRCUNSCRIÇÃO DA UNIDADE FEDERATIVA DE COMPETÊNCIA DA JUNTA COMERCIAL (ART. 1.166 DO CC/2002). SÚMULAS N. 7 DO STJ E 284 DO STF.

1. Extinto o registro da marca em decorrência do fim do prazo de sua vigência, em 2002 (art. 142, I, da Lei n. 9.279/1996 - Lei de Propriedade Industrial), o titular de tal marca perde seus direitos. No presente caso, não há como reexaminar os elementos fático-probatórios com o propósito de aferir se a recorrente obteve sucesso administrativamente na prorrogação do registro da marca "RACIONAL". Como o Tribunal não se manifestou sobre esses documentos no julgamento dos embargos de declaração, caberia à recorrente invocar violação do art. 535 do CPC/1973, o que não fez. Incidência das vedações contidas nas Súmulas n. 7 do STJ e, por analogia, 284 do STF.

2. Recurso especial que não menciona nenhum dispositivo legal - supostamente contrariado - que disponha sobre a alegação da recorrente de ser "intuitivo" que o registro da marca permanece válido durante o trâmite do respectivo pedido de prorrogação. A norma do art. 142, I, da Lei n. 9.279/1996, além de ter sido mencionada de passagem, apenas estabelece uma das hipóteses de extinção do registro. Aplicação, por analogia, da Súmula n. 284 do STF.

3. Caso em que o Tribunal de origem, com base nas provas dos autos, concluiu que os nomes comerciais das empresas litigantes, "Racional Engenharia Ltda." e "Racional Indústria de Pré-Fabricados Ltda.", não geram confusão entre os clientes, destacando que tais pessoas jurídicas (i) encontram-se sediadas, respectivamente, em São Paulo - SP e em Curitiba - PR, (ii) coexistem desde 1989 e (iii) possuem atividades diversas, embora relacionadas à construção civil. Incidência da Súmula n. 7 do STJ.

4. Ausente na sentença e no acórdão recorrido a indicação de fatos ou de atos praticados pela recorrida que impliquem concorrência desleal e efetivo desvio de clientela, acrescento que eventual e pontual equívoco por parte de terceiro constitui erro grosseiro, sobretudo porque os nomes da autora e da ré são muito diferentes, havendo coincidência de um único vocábulo, de uso comum, e foram constituídas em diversas unidades da federação. Ademais, no nome comercial da ré consta a específica área de atuação no mercado de "pré-fabricados", o que facilmente a distingue da abrangente atuação da autora no mercado da construção civil.

5. "A tutela ao nome comercial se circunscreve à unidade federativa de competência da junta comercial em que registrados os atos constitutivos da empresa, podendo ser estendida a todo o território nacional desde que seja feito pedido complementar de arquivamento nas demais juntas comerciais" (REsp n. 1.184.867/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe de 6/6/2014). No presente caso, não consta que o ato constitutivo da autora foi arquivado em diferentes entes federativos nem há notícia de que tenha sido requerida proteção nacionalmente. Incidência da Súmula n. 83 do STJ.

6. Recurso especial parcialmente conhecido e desprovido.

(REsp n. 1.154.627/PR, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 20/8/2019, DJe de 26/8/2019.)

 

 

“AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1708821 - RJ (2020/0129649-0)

                                  DECISÃO

(...)

Não há como afastar essas conclusões em recurso especial, consoante dispõe a Súmula 7 do STJ.

E, assim considerados os fatos, tem-se que quanto à solução jurídica o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência desta Corte, cujo entendimento é de que o nome empresarial só pode constituir óbice para registro de marca se os atos constitutivos da empresa forem depositados em todas as juntas comerciais do Brasil.

Confiram-se os seguintes julgados:

RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. NOME COMERCIAL. MARCAS MISTAS. PRINCÍPIOS DA TERRITORIALIDADE E ESPECIFICIDADE/ESPECIALIDADE. CONVENÇÃO DA UNIÃO DE PARIS - CUP.

1. Não se verifica a alegada violação do art. 535 do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal de origem se pronunciou de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos, nos limites do seu convencimento motivado. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

2. Não há ilegitimidade passiva do Instituto Nacional de Propriedade Industrial-INPI em ação ordinária que busca invalidar decisão administrativa proferida pela autarquia federal no exercício de sua competência de análise de pedidos de registro marcário, sua concessão e declaração administrativa de nulidade.

3. A tutela ao nome comercial se circunscreve à unidade federativa de competência da junta comercial em que registrados os atos constitutivos da empresa, podendo ser estendida a todo o território nacional desde que seja feito pedido complementar de arquivamento nas demais juntas comerciais. Por sua vez, a proteção à marca obedece ao sistema atributivo, sendo adquirida pelo registro validamente expedido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI, que assegura ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, nos termos do art. 129, caput, e § 1º da Lei n. 9.279/1996. (REsp 1190341/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/12/2013, DJe 28/02/2014 e REsp 899.839/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/08/2010, DJe 01/10/2010).

4. O entendimento desta Corte é no sentido de que eventual colidência entre nome empresarial e marca não é resolvido tão somente sob a ótica do princípio da anterioridade do registro, devendo ser levado em conta ainda os princípios da territorialidade, no que concerne ao âmbito geográfico de proteção, bem como o da especificidade, quanto ao tipo de produto e serviço. (REsp 1359666/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/05/2013, DJe 10/06/2013).

5. No caso concreto, equivoca-se o Tribunal de origem ao afirmar que deve ser dada prioridade ao nome empresarial em detrimento da marca, se o arquivamento na junta comercial ocorreu antes do depósito desta no INPI. Para que a reprodução ou imitação de nome empresarial de terceiro constitua óbice a registro de marca, à luz do princípio da territorialidade, faz-se necessário que a proteção ao nome empresarial não goze de tutela restrita a um Estado, mas detenha a exclusividade sobre o uso em todo o território nacional. Porém, é incontroverso da moldura fática que o registro dos atos constitutivos da autora foi feito apenas na Junta Comercial de Blumenau/SC.

6. A Convenção da União de Paris de 1883 - CUP deu origem ao sistema internacional de propriedade industrial com o objetivo de harmonizar o sistema protetivo relativo ao tema nos países signatários, do qual faz parte o Brasil (<http://www.wipo. int/treaties/en>). É verdade que o art. 8º da dita Convenção estabelece que "O nome comercial será protegido em todos os países da União, sem obrigação de depósito ou de registro, quer faça ou não parte de uma marca de fábrica ou de comércio." Não obstante, o escopo desse dispositivo é assegurar a proteção do nome empresarial de determinada sociedade em país diverso do de sua origem, que seja signatário da CUP, e não em seu país natal, onde deve-se atentar às leis locais.

7. O artigo 124, XIX, da Lei da Propriedade Industrial veda o registro de marca que reproduza outra preexistente, ainda que em parte e com acréscimo "suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia". Sob o enfoque pelo ângulo do direito marcário, a possibilidade de confusão e/ou associação entre as marcas é notória, por possuírem identidade fonética e escrita quanto ao elemento nominativo e ambas se destinarem ao segmento mercadológico médico. Assim, é inviável admitir a coexistência de tais marcas.

8. Ainda que não tivesse sido reconhecido o direito de precedência do registro n. 816805776 para a marca mista MULTIMED, ao contrário do que sugere o Tribunal a quo, não seria possível concluir pela nulidade deste. Isso porque tal registro foi concedido em 1994, não sofrendo nenhuma impugnação por parte da autora, seja administrativamente no prazo de seis meses (art. 101 da Lei n. 5.772/1971, correspondente ao atual 169 da Lei n. 9.279/1996), seja judicialmente no prazo de 5 anos, nos termos do art. 174 da Lei n. 9.279/1996. Desse modo, está preclusa a possibilidade de questionar tal registro por meio de processo administrativo de nulidade, bem como por meio de ação de nulidade de registro. Este só poderá ser impugnado por meio de processo administrativo de caducidade e se preenchidos os requisitos legais, nos termos da Lei da Propriedade Industrial.

9. A desconstituição do registro por ação própria é necessária para que possa ser afastada a garantia da exclusividade em todo o território nacional. (REsp 325158/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/08/2006, DJ 09/10/2006, p. 284 e REsp 1189022/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 25/02/2014, DJe 02/04/2014).

10. No decorrer de processo administrativo de nulidade já instaurado, afigura-se temerária a conduta do titular de marca registrada que firma contrato de licenciamento com terceiro, tanto mais se não informar este acerca do óbice sofrido pelo registro marcário. Não há nexo de causalidade entre decisão proferida pelo INPI de concessão do registro marcário, posteriormente invalidada por meio de regular processo administrativo, e a desistência de terceiro em prosseguir com o licenciamento desta marca, ao tomar conhecimento de que a sua titular respondia ao referido processo administrativo de nulidade.

11. Recurso especial provido.

(REsp 1184867/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 15/5/2014, DJe 06/6/2014)

 

AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NOME EMPRESARIAL. MARCA. INSTITUTOS DIVERSOS DE CONVIVÊNCIA POSSÍVEL.

1. As formas de proteção do nome empresarial e da marca não se confundem, a tutela de cada qual tem como fim maior obstar o proveito econômico parasitário, o desvio de clientela, bem como proteger o consumidor. Precedentes.

2. Em regra, nome empresarial e marca semelhantes mas de titularidades diferentes podem conviver, cabendo ressaltar que a tutela do nome empresarial circunscreve-se à unidade federativa de competência da junta comercial em que inscritos os atos constitutivos da empresa, enquanto o registro da marca perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial confere ao titular o direito de uso exclusivo do signo em todo o território nacional.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 972.790/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 10/8/2020, DJe 14/8/2020)

 

PROPRIEDADE INDUSTRIAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATOS ADMINISTRATIVOS PRATICADOS, DE ABSTENÇÃO DE USO DE MARCA E DE REPARAÇÃO DE PERDAS E DANOS. REGISTRO DE MARCA. REPRODUÇÃO DE PARTE DO NOME DE EMPRESA REGISTRADO ANTERIORMENTE. LIMITAÇÃO GEOGRÁFICA À PROTEÇÃO DO NOME EMPRESARIAL.

1. Atualmente, a proteção ao nome comercial se circunscreve à unidade federativa de jurisdição da Junta Comercial em que registrados os atos constitutivos da empresa, podendo ser estendida a todo território nacional se for feito pedido complementar de arquivamento nas demais Juntas Comerciais. Precedentes.

2. Recurso especial provido.

(REsp 1359666/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/05/2013, DJe 10/06/2013) Aplica-se ao caso a Súmula 83/STJ.

Em face do exposto, nego provimento ao agravo em recurso especial.

Intimem-se.

Brasília, 25 de outubro de 2021.

MARIA ISABEL GALLOTTI Relatora

(AREsp n. 1.708.821, Ministra Maria Isabel Gallotti, DJe de 04/11/2021.)”

 

VOTO NO SENTIDO DE ACOMPANHAR O EXMO. RELATOR, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO SUPRA.

 

 



Documento eletrônico assinado por FLAVIO OLIVEIRA LUCAS, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20001006587v6 e do código CRC 8109024f.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FLAVIO OLIVEIRA LUCAS
Data e Hora: 20/6/2022, às 12:43:5

 


 

Processo n. 0001575-27.2007.4.02.5102
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0001575-27.2007.4.02.5102/RJ

RELATOR: Desembargador Federal MARCELLO FERREIRA DE SOUZA GRANADO

APELANTE: BIK BOK CONFECCOES EIRELI

APELANTE: B.B.K. CONFECCOES EIRELI

APELADO: INPI-INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

APELADO: UNIAO DE LOJAS LEADER S.A

VOTO DIVERGENTE

I – A presente ação foi ajuizada por BIK BOK CONFECÇÕES LTDA. e B.B.K. CONFECÇÕES LTDA. (ora apelantes) com o objetivo de invalidar os registros nº 821.964.437 e nº 823.009.769, ambos referentes à marca mista BIK BOK, concedidos em favor da corré UNIÃO DE LOJAS LEADER S.A., para, respectivamente, a classe nacional 25 (especificação: “calçados (inclusive botas e perneiras), couros, peles e derivados (malas, bolsas, pastas), guarda-chuvas, bengalas e guarda-sóis, roupas brancas para homens e crianças, roupas feitas para homens e crianças, materiais esportivos, vestuário, roupas brancas para senhoras (lingerie). calçados (inclusive botas e perneiras), couros, peles e derivados (malas, bolsas, pastas), [...]") e para classe NCL 18 (“Couro e imitações de couros, produtos nessas matérias não incluídos em outras classes; peles de animais; malas e bolsas de viagem; guarda-chuvas, guarda-sóis e bengalas; chicotes, arreios e selaria”).

II - As demandantes sustentam, dentre outros argumentos, a inobservância da vedação prevista no inciso V do artigo 124 da Lei nº 9.279-96, bem como o seu direito de precedência no uso da expressão BIK BOK, nos termos do § 1º do artigo 129 do mesmo diploma.

III – Julgado improcedente o pedido, esta Egrégia Segunda Turma Especializada, em um momento inicial, manteve a sentença ao apreciar a apelação das autoras, em acórdão proferido por maioria, ficando vencido este julgador, que dava provimento ao recurso.

IV – Interposto recurso especial pelas demandantes, esse foi provido parcialmente pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça “para determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que se pronuncie acerca de matéria fática imprescindível para a solução da presente demanda, na esteira dos precedentes desta Corte Superior e em atenção ao devido processo legal”.

V - O direito de precedência previsto no § 1º do artigo 129 da Lei nº 9.279-96 não pode ser limitado temporalmente, apenas durante o curso do procedimento administrativo para a obtenção do registro, devendo e podendo o seu titular, se assim entender, exercê-lo quer administrativamente, quer judicialmente, em decorrência princípio da inafastabilidade da jurisdição

VI - Viola o princípio federativo a limitação do nome empresarial ao território do Estado no qual foram depositados os atos constitutivos da pessoa jurídica, a despeito da redação do artigo 1.166 do Código Civil.

VII - A eficácia do depósito dos atos constitutivos na Junta Comercial de um dos Estados da Federação Brasileira compreende todo território nacional, diante da exegese a ser imprimida ao artigo 1.166 do Código Civil em conformidade com a Constituição da República, que adota o princípio federativo como premissa fundamental.

VIII - Desse modo, a abrangência da proteção ao elemento designativo do nome empresarial não se restringe à unidade da federação em que foram arquivados os atos constitutivos da titular, mostrando-se apta a impedir, com base na vedação no inciso V do artigo 124 da Lei nº 9.279-96, o registro de marca que constitua "reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos", independentemente do depósito complementar dos atos constitutivos nas Juntas Comerciais dos demais Estados da federação.

IX – Voto divergente no sentido de dar provimento à apelação das autoras, reformando a sentença para julgar procedente o pedido invalidação dos registros nº 821.964.437 e nº 823.009.769, ambos referentes à marca mista "BIK BOK", de titularidade da corré UNIÃO DE LOJAS LEADER S.A. Invertida a condenação dos ônus de sucumbência, a ser arcada apenas pela sociedade ré, isentando o INPI no pagamento dessas verbas, consoante o decidido por esta Egrégia Turma em causas análogas.

 

Trata-se de apelação interposta nos autos de ação ajuizada por BIK BOK CONFECÇÕES LTDA. e B.B.K. CONFECÇÕES LTDA. (ora apelantes) em face de UNIÃO DE LOJAS LEADER S.A. e do INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL - INPI, objetivando que “sejam anulados os atos administrativos que concederam os registros nº 821.964.437 e nº 823.009.769, referentes à marca mista "BIK BOK", de titularidade da primeira Ré, para assinalarem as classes 25 e 18, respectivamente”.

Na sentença proferida no processo (Evento 143, TRASLADO22, Página 21; TRASLADO23, Páginas 1-14; dos autos de origem), o MM. Juiz da 35ª Vara Federal do Rio de Janeiro, Guilherme Bollorini Pereira, julgou improcedente o pedido, sob os seguintes fundamentos principais: 1)o cerne da controvérsia posta em juízo reside na invocação, por parte da autora, da prioridade temporal sobre a expressão "BIK BOK", com fulcro no art. 124, inciso V, da LPI, por fazer parte de sua razão social; bem como na aplicabilidade do direito de precedência, com base no artigo 129, parágrafo 1°, do mesmo diploma legal.”; 2)Como se sabe, o Brasil adota o sistema atributivo, segundo o qual os direitos inerentes às marcas surgem a partir do seu registro, e não a partir de seu uso, conforme estatuído no caput do art. 129, da lei 9.279/96. A única exceção prevista no referido diploma legal diz respeito ao DIREITO DE PRECEDÊNCIA do utente de boa-fé e se encontra no art. 129, §1º”; 3)as autoras não lograram, se quer, demonstrar sua boa-fé como pré-utentes, eis que conforme documentos juntados pela empresa-ré às fls. 314/322 e fls. 414/422, a marca e logotipo por elas utilizados já eram anteriormente veiculados no ramo de confecções pela empresa norueguesa Bi Bo AIS, com registro em diversos países, de forma idêntica, como se verifica às fls. 76/80, 87 /93, 95/107, 111 /113, 119/123 e 127 /227, em confronto com a marca mista estrangeira de fls. 314”; 4)no caso em tela, não se poderia privilegiar o possuidor da marca que negligenciou em regularizar sua situação, deixando transcorrer in albis todos os prazos para impugnar os pedidos administrativos de registros de marca(s) que colidam com a(s) por ele usada(s), mesmo se fosse pré-utente de boa-fé, o que não restou comprovado”; 5)No caso em apreço, a 2ª autora iniciou suas atividades se constituindo regularmente perante a Junta Comercial de São Paulo, JUCESP, em 02/03/1990, através da empresa BIK BOK CONFECÇÕES LTDA, tendo por objeto a exploração da indústria e comércio de confecções e acessórios da moda em geral (fls. 43/53)”; 6)A seu turno, a empresa ré, depositou junto ao INPI os pedidos de registro das marcas mista "BIK BOK" de nº 821.964.437 e nº 823.009.769, em 01/09/99 e 27/07/2000, nas classes 25:10-20-60 e NCL(17)18, concedidos em 13/03/2007 e 17/04/2007, respectivamente (fls. 444/447)”; 7)Entendo que a proteção legal da denominação de sociedades empresárias, consistente na proibição de registro de nomes iguais ou análogos a outros anteriormente inscritos, restringe-se ao território do Estado em que localizada a Junta Comercial encarregada do arquivamento dos atos constitutivos da pessoa jurídica”; 8)não se há de falar em extensão da proteção legal conferida às denominações de sociedades empresárias nacionais a todo o território pátrio, com fulcro na Convenção da União de Paris, porquanto, conforme interpretação sistemática, nos moldes da lei nacional, mesmo a tutela do nome comercial estrangeiro somente ocorre em âmbito nacional mediante registro complementar nas Juntas Comerciais de todos os Estados-membros”; 9)a empresa ré depositou seu pedido de registro da marca mista "BIK BOK", processo n. 821.964.437, em 01/09/99, o qual foí publicado na RPI n. 1505, em 09/11/99. Após análise da oposição apresentada pela empresa Bic Esferográfica Brasileira S/A, o INPI decidiu pela concessão do registro em 13/03/2007, o que foi publicado na RPI n. 1888. Com relação ao pedido de registro n. 823.009.769, depositado em 27/07/2000 e concedido em 17/04/2007, verifico que as autoras igualmente não apresentaram Oposição no decorrer desses quase 07 anos (fls. 446/447). Desta forma, observo que as autoras quedaram-se inertes durante todo o trâmite dos processos administrativos, vindo a alegar no Judiciário seu direito de precedência e os riscos que a identidade das marcas podem causar ao consumidor apenas em 26/04/2007”; 10)No caso em apreço não se pode levar em conta, simplesmente, o critério cronológico da prevalência da razão social da autora, diante da anterioridade do arquivamento de seus atos constitutivos na Junta Comercial competente de SP em 02/03/1990 (fls. 43/53), por ser anterior aos depósitos dos pedidos de registro para a marca "BIK BOK", na apresentação mista, processo n. 821.964.437, ocorrido em 01/09/99 (fls.444/445), e n. 823.009.769, ocorrido em 27/07/2000 (fls. 446/447). Ora, apesar do registro de marca ter validade em todo o território nacional, o mesmo não "Ocorre em relação ao nome empresarial, cuja proteção se restringe à unidade federativa de jurisdição da Junta Comercial (art.61, § 1°, do Decreto n. 1.800/96 que regulamenta a Lei n. 8.934/94). No caso em tela, como visto, a parte autora atua no estado de São Paulo, enquanto a empresa-ré possui estabelecimentos comerciais no Rio de Janeiro e Espírito Santo

As autoras BIK BOK CONFECÇÕES LTDA. e B.B.K. CONFECÇÕES LTDA. apelaram da sentença (Evento 143, TRASLADO24, Páginas 3-17; Evento 143, TRASLADO25, Páginas 1-4, autos de origem), argumentando, em resumo: 1)em data muito anterior, já se utilizavam da expressão BIK BOK, ou seja, antes de a primeira ré ter· postulado seu pedido de registro de marca, sendo, pois, incontroverso o direito de precedência”; 2)empresa HOT SCREEN CONFECÇÕES LTDA. (pertencente ao mesmo grupo econômico) já encaminhara perante – INPI o pedido de registro para a sua marca; objeto do processo nº 813.388.546, porém, o INPI não lhe concedeu o registro em razão da existência anterior de marca considerada colidente, qual seja, BIKI MODAS, processo nº 812.925.670”.

Em acórdão da lavra da então Relatora, Eminente Desembargadora Liliane Roriz (Evento 143, TRASLADO28, Página 21), esta Egrégia Segunda Turma Especializada, por maioria, negou provimento ao recurso; ficando vencido este julgador que, consoante voto vista juntado aos autos de origem (Evento 143, TRASLADO28, Páginas 11-17), se pronunciou pelo provimento da apelação de modo da julgar procedente o pedido.

Interposto Recurso Especial pelas autoras, esse foi provido parcialmente pelo STJ “para determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que se pronuncie acerca de matéria fática imprescindível para a solução da presente demanda, na esteira dos precedentes desta Corte Superior e em atenção ao devido processo legal” ” (decisão monocrática proferida no REsp nº 1.371.046, reproduzida no Evento 144, ACSTJSTF1, Páginas 42-47, confirmada em sede de Agravo Interno no acórdão reproduzido no Evento 144, ACSTJSTF1, Página 77; autos de origem), sendo salientado ainda na decisão daquele Sodalício: 1)ao afirmar que, "com a conclusão do procedimento administrativo e a concessão do registro, sem que tenha havido qualquer oposição por parte do detentor do direito de precedência, não cabe invocá-lo para anular judicialmente o _registro de outrem, ante a ocorrência de preclusão" (e-STJ, fl. 693), contrariou o entendimento desta Corte Superior”; 2)pacifico no âmbito do STJ que, ultrapassado o procedimento administrativo para registro de marca perante o INPI, é possível ao titular de nome empresarial ou título de estabelecimento pleitear judicialmente a nulidade do registro concedido mediante violação do art. 124 da Lei n. 9.279/1996”; 3)é imprescindível à solução da presente lide que se apure a extensão da proteção conferida ao nome empresarial sub judice, a fim de se aferir a nulidade, ou não, do registro da marca impugnada”; 4)é irrelevante na presente demanda a existência de marca registrada em outras nações, por empresa que não faz parte da presente lide, tampouco demonstrou interesse na exploração da marca em nosso mercado – matéria absolutamente estranha ao presente processo”.

Com retorno dos autos à esta Corte Regional para fins de cumprimento da decisão proferida pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, o atual relator da apelação, Eminente Desembargador Marcello Granado, ao reapreciar o recurso, houve por bem negar-lhe provimento, sob os seguintes fundamentos: 1)de acordo com o STJ, é imprescindível à solução da lide que se apure a extensão da proteção conferida ao nome empresarial sub judice, a fim de se aferir a nulidade, ou não, do registro da marca impugnada, na esteira dos precedentes daquela Corte Superior e em atenção ao devido processo legal”; 2)Cumprindo a determinação do Superior Tribunal de Justiça, passo à análise, de modo a esclarecer a respeito desse ponto”; 3)Segundo o Enunciado nº 2 na I Jornada de Direito Comercial do STJ/CJF, "A vedação de registro de marca que reproduza ou imite elemento característico ou diferenciador de nome empresarial de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação (art. 124, V, da Lei n. 9.279/1996), deve ser interpretada restritivamente e em consonância com o art. 1.166 do Código Civil”; 4)Na esteira dessa compreensão, o direito ao uso exclusivo de um nome comercial, à luz da legislação vigente, circunscreve-se somente ao estado da federação que possua o registro em sua Junta Comercial (art. 61, § 1º, do Decreto n.1.800/96 que regulamenta a Lei n. 8.934/94), podendo o referido direito ser estendido a outros Estados, desde que seja observado o procedimento especial, conforme os artigos 61, § 1ª e § 2° do Decreto 1.800/96 e o artigo 1.166 do novo Código Civil”; 5)para que o nome empresarial da apelante fosse impeditivo de que outra pessoa registrasse no INPI a marca, seria necessário que a recorrente tivesse feito pedido complementar de arquivamento do nome objeto da ação nas demais Juntas Comerciais”; 6)No entanto, nos autos, há apenas o registro do ato constitutivo perante a Junta Comercial de São Paulo, não havendo pedido complementar de arquivamento de seu nome empresarial nas demais Juntas Comerciais do território nacional”; 7)não há que se falar em extensão da proteção legal conferida às denominações de sociedades empresárias nacionais a todo o território pátrio com fulcro no o art. 8º da Convenção da União de Paris de 1883 (CUP), que estabelece que “O nome comercial será protegido em todos os países da União, sem obrigação de depósito ou de registro, quer faça ou não parte de uma marca de fábrica ou de comércio.”; 8)Segundo interpreta a doutrina e o STJ, o art. 8º da CUP destina-se apenas à proteção do nome empresarial da sociedade em país diverso do de sua origem, e não em seu país natal”; 9)é incontroverso da moldura fática que o registro dos atos constitutivos da apelante foi feito apenas na Junta Comercial de São Paulo. E, conforme já constatado, para que a reprodução ou imitação de nome empresarial de terceiro constitua óbice a registro de marca faz-se necessário que a proteção ao nome empresarial não goze de tutela restrita a um Estado, mas detenha a exclusividade sobre o uso em todo o território”.

Feito esse histórico da causa, passo a proferir meu voto divergente.

Como já salientado, a presente ação foi ajuizada por BIK BOK CONFECÇÕES LTDA. e B.B.K. CONFECÇÕES LTDA. (ora apelantes) com o objetivo de invalidar os registros nº 821.964.437 e nº 823.009.769, ambos referentes à marca mista BIK BOK, concedidos em favor da corré UNIÃO DE LOJAS LEADER S.A., para, respectivamente, a classe nacional 25 (especificação: “calçados (inclusive botas e perneiras), couros, peles e derivados (malas, bolsas, pastas), guarda-chuvas, bengalas e guarda-sóis, roupas brancas para homens e crianças, roupas feitas para homens e crianças, materiais esportivos, vestuário, roupas brancas para senhoras (lingerie). calçados (inclusive botas e perneiras), couros, peles e derivados (malas, bolsas, pastas), guarda-chuvas, bengalas e guarda-sóis, roupas brancas para homens e crianças, roupas feitas para homens e crianças, materiais esportivos, vestuário, roupas brancas para senhoras (lingerie). calçados (inclusive botas e perneiras), couros, peles e derivados (malas, bolsas, pastas), guarda-chuvas, bengalas e guarda-sóis, roupas brancas para homens e crianças, roupas feitas para homens e crianças, materiais esportivos, vestuário, roupas brancas para senhoras (lingerie))”e para classe NCL 18 (“Couro e imitações de couros, produtos nessas matérias não incluídos em outras classes; peles de animais; malas e bolsas de viagem; guarda-chuvas, guarda-sóis e bengalas; chicotes, arreios e selaria”).

Segundo se depreende da inicial, as demandantes sustenta, dentre outros argumentos, a inobservância da vedação prevista no inciso V do artigo 124 da Lei nº 9.279-96 (“V - reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos;”), bem como o seu direito de precedência no uso da expressão BIK BOK, nos termos do § 1º do artigo 129 do mesmo diploma (“§ 1º Toda pessoa que, de boa-fé, na data da prioridade ou depósito, usava no País, há pelo menos 6 (seis) meses, marca idêntica ou semelhante, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, terá direito de precedência ao registro”).

Como tive oportunidade de externar no voto vista proferido no julgamento originário da apelação quanto ao direito de precedência ao registro do pré-utente de boa-fé, “diante da ausência de previsão expressa, inexiste marco temporal para o exercício do mencionado direito, devendo e podendo o seu titular, se assim entender, exercê-lo quer administrativamente, quer judicialmente, em decorrência princípio da inafastabilidade da jurisdição; pois, não há que se falar em preclusão” (Evento 143, TRASLADO28, Páginas 11-17, autos de origem).

Por conseguinte, e reafirmando o entendimento pronunciado no aludido voto vista lavrado nos autos, conquanto não desconheça a orientação do Colendo Superior Tribunal de Justiça acerca dessa matéria específica, este julgador tem a compreensão de que a abrangência da proteção ao elemento designativo do nome empresarial não se restringe à unidade da federação em que foram arquivados os atos constitutivos da titular.

Não se olvida que, ao nome empresarial, foi conferida proteção marcária, pela Convenção da União de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial, da qual o Brasil é signatário, internalizada por meio do Decreto 635, de 21 de agosto de 1992. Proteção essa que se apresenta de forma ampla, conforme dispõe o art. 8º da referida convenção, in verbis:

“Art. 8º. O nome comercial será protegido em todos os países da União, sem obrigação de depósito nem de registro, quer faça ou parte de uma marca de fábrica ou de comércio.”.

Sabe-se que tal previsão que tem por finalidade evitar que o registro de um signo marcário venha a ser concedido em relação direta a um elemento de uso comum, de forma a outorgar ao respectivo titular, quer sob o aspecto do nome empresarial, quer sob o viés marcário propriamente dito, um monopólio indevido. É verdade que essa proteção ampla não se amolda com perfeição ao sistema atributivo de marcas, que tem o registro no Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI, como ato necessário ao reconhecimento das prerrogativas, dentre essas o direito de exclusividade do uso, mas encontra guarida na própria Lei 9.279-96, especificamente no art. 124, V.

E mesmo diante da redação da lei civil quanto à limitação ao território do Estado do nome empresarial (art. 1.166 do Código Civil), a partir do depósito dos atos constitutivos na respectiva junta comercial, deve a disposição sofrer uma interpretação conforme a Constituição da República, para que se ajuste os termos legais a todo o território nacional, consoante a premissa fundamental extraída da noção de um Estado federal: o princípio federativo. Os atos públicos dos Estados valem, portanto, para todos os Estados da Federação, porque em uma Federação estamos, e, como tal, devem ser respeitados e observados em todo o território de nosso Estado Federal. É desse modo que, nos casos de registros de nascimento, casamento, e mesmo de identificação civil, encontramos uma proteção de âmbito nacional.

Ainda que não se tratasse de uma interpretação conforme a Constituição da República, a necessidade de se atribuir efeitos do registro para todo o território nacional é da natureza do ato, é da eficácia do ato – a pessoa jurídica é registrada para todo o Brasil e não, apenas, para o Estado. E não se diga que haveria uma interpretação contra legem, mas, uma interpretação contra verba legis, que com aquela não se confunde e, a interpretação dada pelo juiz deve ser de tal modo a corrigir os equívocos na redação da lei, a fim de que ela se mantenha nos seus valores, sua estrutura e fins.

Assim, entendo que se deve ter como não-escrita a expressão legal que limita ao Estado a eficácia do registro, mediante uma interpretação ab-rogante, e adequada ao sistema jurídico registral brasileiro, que não é restritivo, que não é limitador – aliás, não é e nem poderia sê-lo, pois todo registro feito em um Estado da Federação vale para todo o território da Federação.

Em conclusão, já que os registros ora impugnados foram requeridos nos anos de 1999 e 2000, muito após ao depósito dos atos constitutivos da parte autora, na respectiva junta comercial, que remonta aos idos de 1986; nessa última análise, não há como afastar a ilegalidade dos privilégios sobre o uso da expressão BIK BOK concedidos pelo INPI.

Isso posto, voto no sentido de, divergindo respeitosamente do Eminente Relator, dar provimento à apelação das autoras, para reformar a sentença e julgar procedente o pedido invalidação dos registros nº 821.964.437 e nº 823.009.769, ambos referentes à marca mista "BIK BOK", de titularidade da corré UNIÃO DE LOJAS LEADER S.A. Inverto a condenação dos ônus de sucumbência, a ser arcada apenas pela sociedade ré, isentando o INPI no pagamento dessas verbas, consoante o decidido por esta Egrégia Turma em causas análogas (verbi gratia: Apelação Cível nº 0004700-93.2013.4.02.5101, Julgamento em 31.07.2017).



Documento eletrônico assinado por ANDRÉ FONTES, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20001409074v5 e do código CRC 47f5aadf.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANDRÉ FONTES
Data e Hora: 13/4/2023, às 21:51:48

 


 

Processo n. 0001575-27.2007.4.02.5102
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 0001575-27.2007.4.02.5102/RJ

RELATOR: Desembargador Federal MARCELLO FERREIRA DE SOUZA GRANADO

APELANTE: BIK BOK CONFECCOES EIRELI

APELANTE: B.B.K. CONFECCOES EIRELI

APELADO: UNIAO DE LOJAS LEADER S.A

APELADO: Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI

EMENTA

apelação. Propriedade industrial. direito marcário. RETORNO DOS AUTOS DO  STJ.  direito de precedência. nome comercial.  PROTEÇÃO AO NOME EMPRESARIAL POSSUI ÂMBITO ESTADUAL. JURISPRUDÊNCIA DO STJ.  apelação a que se nega provimento.

 

1. Cuida-se de retorno do Colendo Superior Tribunal de Justiça, com decisão no Recurso Especial, interpostor por B.B.K. CONFECÇÕES EIRELI e  outro, no sentido do seu provimento para determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que se pronuncie acerca de matéria fática -  proteção conferida ao nome empresarial sub judice- imprescindível para a solução da presente demanda.

2.  O direito ao uso exclusivo de um nome comercial, à luz da legislação vigente, circunscreve-se somente ao estado da federação que possua o registro em sua Junta Comercial (art. 61, § 1º, do Decreto n. 1.800/96 que regulamenta a Lei n. 8.934/94), podendo o referido direito ser estendido a outros Estados, desde que seja observado o procedimento especial, conforme os artigos 61, § 1ª e § 2° do Decreto 1.800/96 e o artigo 1.166 do novo Código Civil.

3. Nos autos, há apenas o registro do ato constitutivo perante a Junta Comercial de São Paulo, não havendo pedido complementar de arquivamento de seu nome empresarial nas demais Juntas Comerciais do território nacional.

4. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2a. Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por maioria, vencido o Desembargador Federal ANDRÉ FONTES, NEGAR PROVIMENTO à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 30 de maio de 2023.